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TENDÊNCIAS/DEBATES
A Câmara dos Deputados deve aprovar o voto em lista fechada para eleições proporcionais?
SIM
Racionalização do debate político
LUIZ SÉRGIO
NÃO HÁ sistema eleitoral perfeito. À luz dessa compreensão, a comissão especial encarregada de discutir a reforma política elaborou proposta do voto em lista.
Para tanto, considerou a excessiva
personalização do voto, induzida por
um sistema que fragiliza as instituições partidárias e exacerba o individualismo, tanto dentro quanto fora
dos partidos, ao mesmo tempo em
que contribui para pulverizar de maneira artificial as forças políticas.
O voto em lista tem a virtude pedagógica de racionalizar o debate político e permitir ao eleitorado conhecer o
programa que está escolhendo. O
atual sistema não permite um debate
racional. A cada eleição, é uma balbúrdia de siglas, materiais diversos e
propostas desconexas que invadem
ruas e lares, produzindo muito barulho, pouco esclarecimento e nenhuma politização. Tudo resulta em bancadas fragmentadas, eleitos exóticos
e ingovernabilidade.
Os adversários do voto em lista alegam que sua adoção tira do eleitor o
direito de escolher seu candidato. Pura embromação, pois ignora que hoje
o eleitor pode votar num candidato e
contribuir para eleger outro do mesmo partido ou de outra sigla coligada.
A lista permite construir um partido mais solidário, coletivo e que possa
nos unificar no processo das campanhas políticas. Cria condições de
oportunidades mais igualitárias.
Aquilo que é antipartido e anticoletivo é o individualismo, prática que o
PT nega na sua essência. A lista procura assegurar ao eleitor o direito de
optar por um programa e uma orientação ideológica clara.
Teme-se o excesso de poder nas direções partidárias e nos chamados caciques. Ora, nada impede a aprovação
de legislação específica com regras
democráticas para reger a confecção
das listas, como a consulta ao conjunto dos filiados aos partidos. Estes podem estabelecer as normas. Se incorrerem em métodos autoritários, certamente serão punidos pelas urnas.
A lista preordenada -ou um derivativo dela, que não descaracterize o
esqueleto da proposta- viabiliza o financiamento público de campanha,
que dará dignidade a parlamentares e
partidos políticos, além de independência ao exercício do mandato.
O financiamento público unifica as
campanhas, que serão conduzidas
unicamente pelos partidos, facilita o
controle e a fiscalização e, acima de
tudo, barateia as campanhas, cujo
custo crescente chega a agredir a dignidade do nosso povo. O atual modelo
de financiamento está esgotado. Favorece escandalosamente candidatos
com acesso aos donos do dinheiro,
encarece absurdamente as campanhas, torna os candidatos e os eleitos
reféns do poder econômico. É a matriz da prática da corrupção e contribui para a desmoralização da atividade política e da democracia.
Quem, como alguns tucanos, propõe voto distrital é porque não quer
fazer nenhuma reforma. O sistema
distrital, em todas as suas variantes, é
uma aberração antidemocrática que
sufoca as minorias. A Inglaterra padece do mal desde 1945. Lá, o Partido Liberal é freqüentemente prejudicado,
pois o percentual de cadeiras que recebe é sempre inferior ao seu percentual de votos. Com uma média de
12,4% dos votos, obtém uma média de
1,9% das cadeiras. Em 1983, recebeu
25,04% dos votos e elegeu apenas
3,5% dos representantes.
Na Alemanha, dadas as deformações do sistema distrital, se adotou
um sistema de listas para eleger a metade do Parlamento. Dir-se-ia que a
elite alemã, consciente de seu passado nada exemplar em matéria de democracia, resolveu permitir que pelo
menos metade do seu Parlamento
fosse eleita de forma democrática.
Qualquer versão do sistema distrital é antidemocrática e inviável, até
porque requer reforma constitucional que depende da aprovação de 308
deputados. Ninguém consegue construir essa maioria. Precisamos, sim,
discutir com sinceridade os pontos
que estão na pauta da Câmara: voto
em lista, proibição de coligações proporcionais, financiamento público e
fidelidade partidária. A reforma precisa reafirmar, acima de tudo, a democracia, a transparência, o controle
sobre os gastos, a moralização da
campanha e a dignidade para o exercício do mandato.
Ainda há tempo e esperança.
LUIZ SÉRGIO, 49, metalúrgico especializado em construção naval, é deputado federal pelo PT-RJ e líder do partido
na Câmara. Foi prefeito de Angra dos Reis (1993-1996).
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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