São Paulo, terça-feira, 17 de fevereiro de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

1%

RIO DE JANEIRO - No auge do escândalo que provocou o impedimento de Collor, o que mais me impressionou foi a rapidez e a eficiência com que as movimentações das contas bancárias do presidente e de seus auxiliares mais próximos foram parar na imprensa e na CPI.
Dizia-se, na ocasião, que era trabalho miúdo, trabalho de formiga da militância do PT, que tinha (e parece que ainda tem) enorme rede de informantes e interessados em rastrear contas de adversários, sejam circunstâncias ou substanciais.
Com as revelações do mais recente abalo sísmico no centro do poder, ficamos sabendo que um funcionário altamente categorizado na nomenclatura do atual governo foi peça importante no rastreamento de contas que, teoricamente, estariam resguardadas pelo sigilo bancário, que só é sigilo quando interessa a quem precisa dele.
Não freqüento a turma que fica escandalizada com revelações de natureza igual. Nunca reconheci no PT o monopólio da moral e da verdade. E, para ser sincero, em nenhum outro partido, instituição ou pessoa.
Enquanto prevalecer a hipocrisia dos financiamentos das campanhas eleitorais, casos como o atual serão corriqueiros, um ventilador eficiente, capaz de jogar aquilo em todos e em tudo.
O abacaxi será descascado, por conveniência política de todos os partidos, de todos os candidatos -eleitos ou não. Compreende-se. Mas, desta vez, como no clichê dos roteiristas de cinema policial, a coisa foi longe demais.
Simplificando a questão, admite-se que, durante as campanhas eleitorais, todos os partidos e candidatos busquem patrocínios -e dinheiro, como dizia o imperador Vespasiano, "non olet", não fede.
Mas começa a feder quando os intermediários entre os candidatos e os patrocinadores cobram 1% do preço global da operação.
Quando se trata de gente miúda, até que a comissão é banal. Mas, quando se tratou das privatizações do governo anterior, o preço dos favores foi bem superior.


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