São Paulo, quinta-feira, 17 de fevereiro de 2005

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ELIANE CANTANHÊDE

O Severino e o Silva

BRASÍLIA - Quem está acostumado à linguagem empolada dos líderes políticos e à vazia dos diplomatas vai ter de se reciclar com o novo presidente da Câmara, Severino Cavalcanti. O "rei do baixo clero" é bem diferente: direto, objetivo, cortante.
Foi assim a entrevista de estréia de Severino, ontem, num ambiente cheio de modernidades e cores elegantes criado pelo seu antecessor na TV Câmara. Ele nem olhou ao redor. Sentou-se, respondeu a 15 perguntas num recorde de aproximadamente 27 minutos e foi-se embora, deixando os jornalistas cheios de notícias.
Ainda em tom de campanha, continuou falando mais para dentro do que para fora da Câmara. "O presidente [ele mesmo] não é um ditador", "não vai ter igrejinha aqui dentro", "quem manda são os deputados, quem vai mandar é o plenário", disse, manifestando vontade impossível: "Acabar com essa história de baixo clero, médio clero, novo clero".
E manteve as promessas: aumento de salário já, garantia do recesso de 90 dias, distribuição de viagens internacionais irmamente. Só avisou que não aceita esse troca-troca de partido toda hora. "Uma imoralidade."
Aliás, como você a esta altura já sabe, ele é cheio das moralidades e contra essa história de "homem com homem e mulher com mulher".
Mas o que interessa mesmo são os acenos do novo presidente da Câmara para Lula, com quem se encontra hoje. Como todos os seus últimos muitos antecessores, anunciou independência, sem subordinação ao Planalto. Ainda a ver.
Por fim, o anúncio mais palpitante de Severino: é a favor da prorrogação do mandato de Lula por dois anos, sem direito a reeleição. Ou seja: praticamente ameaçou tocar em frente emendas constitucionais nesse sentido. Lula que se cuide. Já imaginou que guerra em ano pré-reeleitoral?
Severino, portanto, é assim: diretíssimo e transparente no que diz, mas cheios de cartas na manga inimagináveis nas relações com o Planalto. Aliás, é bom a gente ir aprendendo. O baixo clero, com ou sem metáforas, aparentemente veio para ficar.


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