São Paulo, segunda-feira, 17 de junho de 2002

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VINICIUS TORRES FREIRE

Os demônios vermelhos

SÃO PAULO - Não, não se trata do time da Bélgica, que, esperamos, terá sido despachado pelo maior risco Brasil de hoje, o time de Scolari. Os vermelhos demonizados aqui são do PT, que, antes mesmo do primeiro turno, já é culpado de "transformar o Brasil numa Argentina", seja lá o que isso signifique (que os brasileiros vão ler tantos livros e comer tanto como os argentinos, por exemplo?).
É verdade que a difamação tem melhorado de nível, por assim dizer. Em 1989, Lula da Silva eleito, a classe média teria de dividir suas posses, inclusive casas, e os empresários todos dariam o fora do país. Lula, aliás, morava no Morumbi por essa época.
É verdade também que o PT largou parte do besteirol econômico de 1989. Mas, quanto mais o programa do PT fica "consistente", mais é culpado pela sinistra dívida de Pedro Malan e FHC ("consistente" entre aspas, como os economistas dizem, um falso cognato do inglês "consistent", que, no caso, quer dizer coerente ou compatível. Já ouvi Malan dizer "reinforçar" em vez de reforçar).
Decerto a crise financeira muito tem a ver com o medo do mercado na hora do pênalti, quer dizer, com trocas de governo em geral e com a vitória de Lula em particular.
Mas a crise tem a ver ainda com a desconfiança dos mercados em relação à América Latina, com a aversão deles a assumir riscos em época de calote de grandes empresas americanas, com a dívida enorme, crescimento baixo e exportações minúsculas do Brasil. Até membros estrangeiros da casta econômica mundializada, da qual fazem parte os economistas de FHC, dizem que pode vir calote quem quer que seja o eleito (um absurdo, mas não é o ponto). Mas o antipetismo joga nas costas de Lula oito anos de incúria financeira.
Vai piorar. O "jingle" de José Serra diz que o Brasil não vai "ser outra Argentina" (quer dizer, com os outros candidatos, vai). O PT ainda tem muito o que explicar sobre o que fará da dívida, decerto. Mas Serra, o governista, também tem de explicar que país é este que o seu partido vai entregar ao próximo governo. Por ora, ele só cala sobre o assunto.



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