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FERNANDO GABEIRA
Última sessão
RIO DE JANEIRO - Na última
sessão do Congresso, no semestre,
tentei falar. É preciso ir ao Senado
se inscrever. O caminho passa por
uma parede envidraçada. Há uma
entrada discreta e, pela escada em
caracol, chega-se ao subterrâneo,
cheio de funcionários. Um deles
tem o livro. Havia cinco nomes de
deputados, com o meu. Pensei: Sarney, ao ler esses nomes, não virá
presidir o Congresso. Foi assim
com Renan. Eles abandonam o
Congresso, antes do Senado.
Há uma dezena de deputados dispostos a enfrentar o PMDB, aliados
e a combatividade da estrela vermelha. Aliás, voltei ao Salão Verde,
pensando nela. A estrela vermelha
para mim não tem sentido. Eu a vi
nos tanques sérvios que atiravam
nos civis e em nós, repórteres. Agarrados à estrela vermelha, perpetraram crimes horrendos sob o título
de limpeza étnica.
Assim como a suástica, estrelas
vermelhas levam ao desastre, quando se decide obedecer, cegamente, a
um projeto de poder. Mais importante do que símbolos políticos, é a
velhice. No passado, a velhice era
cultuada, como um tempo de sabedoria e generosidade. Hoje, com o
comportamento de José Sarney, esta imagem está ameaçada. No passado, falava-se em respeito aos cabelos brancos. Hoje, já nem se usam
cabelos brancos.
O que eram apenas defeitos colaterais, como a teimosia e a perda de
contato com a realidade, hoje prevalecem. Ouço senadores clamando
por um gesto de grandeza, a renúncia. Cercado por uma alcateia, faminta de cargos e vantagens, Sarney não renuncia.
Não se trata só de um constrangimento ao ver o Senado definido como casa de horrores. Mas o de conviver um grupo de homens idosos,
movendo-se com uma desenvoltura criminosa, unindo nos lábios do
povo as palavras velho e safado, como se fossem gêmeas que nascem
ligadas. Tempo de tormentas.
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