São Paulo, quinta-feira, 17 de outubro de 2002

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CLÓVIS ROSSI

O sub e a águia

MIAMI - Donna Hrinak, que parece gozar de especial carinho na cúpula do PT, já havia sugerido a Luiz Inácio Lula da Silva: pode criticar o quanto quiser a política norte-americana, mas não entre em críticas pessoais ao presidente.
Referia-se à declaração de Lula segundo a qual, de cada dez vezes que George Walker Bush abre a boca, nove são para falar de guerra.
Não tenho a menor idéia de como Hrinak vai reagir ao ataque de Lula a Robert Zoellick, uma espécie de ministro de Comércio Exterior norte-americano, qualificado de "sub do sub do sub" de não sei quem. Na forma, é bobagem: o cargo de Zoellick tem status ministerial. Logo ele só é sub de Bush, de ninguém mais.
No conteúdo, é uma bravata equivalente à arrogância do funcionário norte-americano. Ao dizer que o Brasil ou aceita a Alca (Área de Livre Comércio das Américas) ou vai ter de vender os seus produtos na Antártida (onde não há compradores), Zoellick está exibindo a prepotência típica dos negociadores comerciais norte-americanos (o que, na gestão Bush, virou regra geral).
O diabo é que Zoellick tem toda a incontrastável força dos Estados Unidos para fazer valer a sua prepotência. E Lula, o que terá se eleito?
A menos que queira jogar a Alca na lata do lixo (hipótese que pode, de fato, fazer o Brasil ter a Antártida como principal mercado), Lula terá de negociá-la basicamente nos termos definidos pelo governo Fernando Henrique Cardoso.
Ao Brasil, a Alca só interessa se os EUA eliminarem o protecionismo, tarifário ou de outra natureza, que prejudicam exatamente a produção brasileira mais competitiva. E se, além disso, não quiserem impor regras (sobre investimentos, por exemplo) que impeçam políticas internas, sejam quais forem.
Para isso, no entanto, o PT vai precisar de uma ampla coalizão interna -política, sindical e empresarial- em torno da Alca. Hoje, ela é fragmentada e hesitante. Zoellick pode ser o que Lula quiser, mas tem atrás dele o peso da águia americana.


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