São Paulo, segunda-feira, 18 de novembro de 2002

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MARTA SALOMON

Qual é a âncora?

BRASÍLIA - Era final da tarde de 19 de janeiro de 99. A equipe econômica acertava contas com o FMI depois da implosão da âncora cambial -até ali o principal freio da inflação. Falava-se em alta de 40% dos preços.
Numa das salas da sede do Fundo, em Washington, o ministro Pedro Malan aposta com jornalistas que a inflação ficaria sob controle. Acabara de fechar compromisso com um aperto nos gastos públicos e um choque nos juros, que bateria pouco depois a marca dos 45%. No jargão técnico, eram as novas âncoras fiscal e monetária que substituiriam oficialmente o câmbio fixo.
Mas o argumento que Malan apresentou na conversa daquela tarde parecia mais contundente: faltaria renda no país para sustentar uma alta nos preços. Tratava-se da âncora salarial, como raramente foi mencionada de forma tão clara fora dali.
Não seria muito inteligente esperar que Lula e seus assessores usassem o período de montagem de governo para tagarelar sobre a inflação, num momento talvez ainda mais delicado que janeiro de 99.
O momento é para prosperarem piadinhas do tipo: quem está "comprado" em dólar (aposta na alta) diz que o substituto de Armínio Fraga será João Pedro Stédile (líder do MST), quem está "vendido" diz que será Alan Greenspan (presidente do banco central dos EUA).
Dito isso, vamos às migalhas colhidas até agora do pensamento petista: 1) os juros devem subir nos próximos dias se o Banco Central achar melhor assim; 2) os trabalhadores, como os empresários, devem dar sua cota de sacrifício no pacto social que se esboça; 3) o aperto nas contas públicas pode aumentar, ainda que cada ponto percentual extra de superávit primário represente R$ 15,4 bilhões, mais de duas vezes o que o Orçamento destina a investimentos em 2003; 4) por ora, o jeito é prorrogar a cobrança de impostos e estudar o aumento para 0,80 da taxação por litro de gasolina.
Se os petistas descobriram uma nova âncora para o real, é segredo.



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