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MARTA SALOMON
Qual é a âncora?
BRASÍLIA - Era final da tarde de 19 de janeiro de 99. A equipe econômica
acertava contas com o FMI depois da
implosão da âncora cambial -até
ali o principal freio da inflação. Falava-se em alta de 40% dos preços.
Numa das salas da sede do Fundo,
em Washington, o ministro Pedro
Malan aposta com jornalistas que a
inflação ficaria sob controle. Acabara
de fechar compromisso com um aperto nos gastos públicos e um choque
nos juros, que bateria pouco depois a
marca dos 45%. No jargão técnico,
eram as novas âncoras fiscal e monetária que substituiriam oficialmente
o câmbio fixo.
Mas o argumento que Malan apresentou na conversa daquela tarde
parecia mais contundente: faltaria
renda no país para sustentar uma alta nos preços. Tratava-se da âncora
salarial, como raramente foi mencionada de forma tão clara fora dali.
Não seria muito inteligente esperar
que Lula e seus assessores usassem o
período de montagem de governo para tagarelar sobre a inflação, num
momento talvez ainda mais delicado
que janeiro de 99.
O momento é para prosperarem
piadinhas do tipo: quem está "comprado" em dólar (aposta na alta) diz
que o substituto de Armínio Fraga será João Pedro Stédile (líder do MST),
quem está "vendido" diz que será
Alan Greenspan (presidente do banco central dos EUA).
Dito isso, vamos às migalhas colhidas até agora do pensamento petista:
1) os juros devem subir nos próximos
dias se o Banco Central achar melhor
assim; 2) os trabalhadores, como os
empresários, devem dar sua cota de
sacrifício no pacto social que se esboça; 3) o aperto nas contas públicas
pode aumentar, ainda que cada ponto percentual extra de superávit primário represente R$ 15,4 bilhões,
mais de duas vezes o que o Orçamento destina a investimentos em 2003;
4) por ora, o jeito é prorrogar a cobrança de impostos e estudar o aumento para 0,80 da taxação por litro
de gasolina.
Se os petistas descobriram uma nova âncora para o real, é segredo.
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