São Paulo, terça-feira, 19 de janeiro de 2010

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ELIANE CANTANHÊDE

A derrota da vitória

BRASÍLIA - Simples e verdadeiro, o artigo do antropólogo Omar Thomaz e do estudante Otávio Jorge, da Unicamp, mostra bem o que é o Haiti, o que representa a Minustah e quais as perspectivas (ou falta delas) do país e dos haitianos. E não falaram de cátedra só. Meninos, eles estavam lá e viram. Colocam o terremoto no devido lugar: devastador, mas não mais do que as intervenções, ocupações e massacres promovidos, alimentados ou ignorados pelas mesmas potências que hoje se arrogam em salvadoras da pátria -que elas e o terremoto destruíram. Quanto à Minustah, Jorge já escrevera que a ONU gasta meio bilhão de dólares/ano para fazer do Haiti um teste de guerra. Citava um comandante brasileiro que admite que as tropas brasileiras estão ali com um só propósito: controlar a criminalidade germinada na miséria absoluta para depois transplantar a expertise para as favelas cariocas. O Haiti é um "laboratório".
Justiça seja feita: tanto Jobim (Defesa) como Amorim (Itamaraty) cobraram, inúmeras vezes, mais verbas e a evolução da missão de paz (ou melhor, policial) para uma missão de reconstrução do país. Numa visita a Porto Príncipe, há um ano, Jobim defendeu que, contida a violência urbana, engenheiros do Exército seriam mais úteis do que soldados. A ONU (leia-se EUA) nunca fez a virada.
Seis anos, milhares de militares de várias nacionalidades e bilhões de dólares depois, a pergunta é: para que serve a Minustah? Neste momento, segundo Jorge, serve para remover os escombros dos hotéis de luxo onde se hospedavam os ricos visitantes estrangeiros. O povo?
Ora, o povo...
O dado mais cruel, porém, é que o Haiti é um país onde os escravos conseguiram se libertar e constituir a primeira República negra do mundo. Para Jorge, o trágico é que "os haitianos pagam diariamente por essa ousadia". Não é de chorar?

elianec@uol.com.br


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