São Paulo, terça-feira, 19 de abril de 2005

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CORRUPÇÃO CAPILAR

A Controladoria Geral da União identificou o que considera serem irregularidades graves na aplicação de recursos públicos em cerca de 90% dos municípios brasileiros submetidos a auditoria do governo federal. Desde que começou a realizar este trabalho, há dois anos, a CGU já analisou as finanças de 741 municípios, escolhidos por sorteio entre os 5.565 existentes no país.
Embora a prudência recomende que se deva evitar as generalizações, a amostragem de municípios auditados já é representativa o bastante para que se diga, sem risco de ser leviano, que o problema é estrutural e tem dimensão nacional -e assim deve ser tratado. O ministro do Controle e da Transparência, Waldir Pires, disse, em entrevista a esta Folha publicada ontem, estimar que os desvios ultrapassam os 20% do montante transferido aos municípios. Não se está, pois, diante dos infames "casos isolados", como gostam de justificar autoridades diante de evidências de malversação de recursos públicos.
O próprio Waldir Pires reconhece que a CGU está como que colhendo "in loco" as provas materiais da sobrevivência do patrimonialismo, do coronelismo e de relações oligárquicas no interior do Brasil moderno. A identificação do problema caso a caso e em toda a sua extensão parece ser a maneira mais eficaz de combater formas por definição capilarizadas de corrupção. Mais do que apenas encaminhar os resultados das auditorias para que os órgãos responsáveis tomem providências legais, espera-se que a atuação da CGU produza a médio prazo também efeitos inibitórios e pedagógicos.
Mas, mesmo iniciativas positivas, como esta, devem ser recebidas com uma saudável dose de ceticismo. O risco de que o governo ou setores da administração federal façam uso político de sua ação moralizadora nos municípios é uma possibilidade para a qual se deve estar sempre atento.
Afinal, é mais fácil e vantajoso para qualquer governo investigar a corrupção e os desvios dos outros.


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