São Paulo, segunda-feira, 19 de abril de 2010

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RUY CASTRO

Por ruas limpas

RIO DE JANEIRO - Leio na Mônica que os jovens que invadiram a última Bienal e picharam seus vidros e paredes foram convidados a participar oficialmente do evento este ano. Ótimo. É a pichação, assim como aconteceu com o grafite, sendo elevada à categoria de arte e, como tal, digna de ser exposta em bienais, mostras, retrospectivas.
Sou a favor de que a Bienal lhes reserve enormes pavilhões, mesmo porque a pichação exige fachadas inteiras de edifícios, quando não monumentos como o Cristo Redentor. Sou a favor também de que museus como o Masp, o MAM do Rio e o Mac, de Niterói, construam anexos com paredes internas para abrigar pichações permanentes, talvez permitindo que, de dois em dois meses, turmas diferentes de pichadores façam intervenções sobre as pichações já existentes e se esfolem uns aos outros.
Enfim, sou a favor de qualquer medida que livre nossas ruas da lambança promovida por esses ágrafos cuja forma de preencher seu vazio interior e pobreza de espírito é agredir a propriedade pública ou privada. Aliás, não há muita diferença entre seus garatujos e certas instalações em que tropeçamos nos salões -basta que os ensaístas descubram neles os conteúdos que enxergam em caixas cheias de minhocas ou em um cachorro sendo deixado para morrer de fome e de sede diante dos visitantes.
Não quer dizer que, se o mundo das artes cooptar os pichadores, eles deixarão de avacalhar as cidades. Vide o grafite. Para cada grafiteiro tirado da marginalidade e levado a expor em Berlim ou Amsterdã, as ruas ganham outros cinco sub-Will Eisners com suas mesmas figuras de língua de fora e olhos esbugalhados.
Não discuto que sejam "artistas". Só o direito de o cidadão andar pela rua sem ser assomado por desenhos berrantes que não pediu para ver.


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