São Paulo, quarta-feira, 19 de maio de 2004

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CLÓVIS ROSSI

Projeto x manual

BRUXELAS - É uma pena, mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se engana ao dizer que seu governo tem, sim, um projeto.
O PT possuía, antes de ser governo, uma história e um difuso projeto, consubstanciado na palavra "mudança". É verdade que a palavra serve como muleta retórica para muita coisa. Mas, no caso do PT, ficava ao menos subentendido, quando não era explícito, que, uma vez no poder, o partido mudaria o modelo econômico-social.
Contudo, ao chegar ao Palácio do Planalto, o PT jogou fora sua história e, em vez de um projeto, qualquer projeto, adotou um manual básico, um bê-á-bá de economia, aquele que diz que, para combater a inflação, é preciso aumentar estupidamente os juros e que, para tranqüilizar os credores, é preciso elevar o superávit fiscal a alturas obscenas.
Manual é manual, tem lá seu valor, mas está longe de ser um projeto. De suas inconsistências e insuficiências o leitor da Folha está devidamente informado pelos textos periódicos de Luís Nassif e Paulo Nogueira Batista Júnior. Não é preciso, portanto, descer a detalhes.
O grave nessa história não é apenas a debilidade do manual em uso. Mais grave ainda é o presidente pensar que tem um projeto, sem que ninguém, em seu círculo íntimo, tenha a coragem de lhe dizer a verdade.
Ao contrário: seu ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, admite suas limitações em assuntos econômicos, mas, não obstante, acha que tem um projeto.
Se houvesse de fato algo parecido, não faria o menor sentido o chefe da Casa Civil, José Dirceu, sair por aí pregando um pacto nacional (outra velha e inútil muleta retórica). Quem tem projeto não precisa de pacto. Executa-o e seja o que Deus quiser.
É natural, portanto, que a área econômica tenha reagido irada contra a proposta de Dirceu. Equivale a gritar que o rei está nu. E está.


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