UOL




São Paulo, domingo, 19 de outubro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ELIANE CANTANHÊDE

À saúde o que é da saúde

BRASÍLIA - Saúde é saúde, vacina, hospital, cirurgia, remédio, equipamento, médico. E saneamento, segurança, alimentação, lazer, trânsito, habitação. É, enfim, nascimento, vida e morte com dignidade.
Não dá para entender a decisão do governo Lula de surrupiar uma grana preta da saúde para jogar no programa de erradicação da miséria -que veio para somar, não diminuir. Soa a jeitinho. E abre um precedente perigoso. Amanhã, tira-se outro naco para combater a violência (arma de fogo é a segunda causa de morte em áreas de São Paulo) ou para cobrir buraco em estrada (acidente também acaba com a saúde, certo?). Para a saúde mesmo, migalhas.
Em números, grosso modo, as verbas para a saúde em 2002 (último Orçamento consolidado) batiam em R$ 42 bilhões, somando União, Estados e municípios, o que dá R$ 0,70 por dia para cada cidadão. Autor da conta, o ex-deputado, ex-secretário paulistano e ex-petista Eduardo Jorge lembra que isso vale para paciente de malária, deficiente renal, safenado, vítima de Aids e câncer. R$ 0,70!
Com o governo Lula, em vez de aumentar, esse valor pode diminuir. O reajuste do orçamento federal da saúde deveria ser de R$ 5,5 bilhões, mas o governo abocanhou R$ 4,4 bi: R$ 3,5 bi para a erradicação da miséria e mais R$ 900 milhões excluídos sabe-se lá por quê.
Eduardo Jorge e o ainda petista Roberto Gouveia (SP) entraram com ação no Ministério Público exigindo revisão do Orçamento, mas não gritam sozinhos e têm pressa -antes que o exemplo de cima tenha efeito em cascata nas 27 unidades da Federação e nos mais de 5.500 municípios, todo mundo desviando verbas da saúde para a fome ou algo assim.
Que o governo do PT tenha enveredado pelos juros estratosféricos, superávits primários mais realistas que o rei e reformas duras de Estado pode ser justificável do ponto de vista da credibilidade, confiança do mercado, investimentos, blablablá. Mas que o governo do PT surrupie verba da saúde pública é absolutamente indesculpável. Aí já é demais.


Texto Anterior: Buenos Aires - Clóvis Rossi: Argentina, economia e teologia
Próximo Texto: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Tese de mestrado
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.