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Brasil na Opep?
LUIZ GONZAGA BERTELLI
Causou estranheza que a notícia sobre Tupi fosse apregoada no bojo da crise de abastecimento
do gás natural
À ÉPOCA de criação da estatal
brasileira do petróleo, os seus
dirigentes não ignoravam que
as reservas do petróleo no Brasil
constituíam uma fatalidade geológica, eis que não atingem a superfície da
terra, ao contrário de outras regiões,
onde o combustível fóssil brota espontaneamente dos poços graças à riqueza das jazidas, como ocorre na
Arábia, no Iraque, no Kuwait e no Irã.
O Brasil era, reconhecidamente,
um país sem petróleo, com modesta
produção terrestre.
Com o fracasso de exploração em
terra, foi contratado, em 1960, o geólogo americano Walter Link para chefiar a exploração da Petrobras.
Antes
do retorno à sua pátria, ele vaticinou a
possibilidade de encontrarmos em
abundância o óleo cru no mar e muito
pouco em terra firme.
Contudo, os resultados positivos da
exploração marítima somente começariam em 1974, com as descobertas
pioneiras em águas profundas na bacia fluminense de Campos.
Em 1975, o PIB apresentava notável queda no ritmo de crescimento e a
dívida externa aumentava assustadoramente. Em decorrência, o então
presidente Geisel autorizou a realização dos contratos de risco na pesquisa
do petróleo, afirmando: "O monopólio conferido à Petrobras deve ser entendido como meio para que possa
cumprir a finalidade da empresa: o
abastecimento nacional do petróleo".
Mais tarde, surgiriam os campos de
Santos e do Espírito Santo, com o desenvolvimento de inovadoras técnicas de extração. A Petrobras passaria
a retirar o combustível fóssil de uma
profundidade de muitos quilômetros
abaixo do mar, sendo a primeira empresa a perfurar tão longe.
Doravante, haverá necessidade de
dimensionar a real capacidade de Tupi, embora os geólogos anunciem,
ufanisticamente, que ela conduzirá o
Brasil à honrosa posição do nono produtor de petróleo no universo. Para
alguns assessores, o presidente Lula
tem confessado que a nova bacia petrolífera poderá superar os 80 bilhões
de barris, o que corresponderia a 150
anos do atual consumo brasileiro.
Recentemente, o presidente do
Instituto do Petróleo da Inglaterra,
Pierre Jungels, afirmou que, para a
Petrobras obter petróleo suficiente,
seria necessário US$ 1 trilhão em capitais de investimento, além de 350
mil engenheiros e técnicos, assim como consideráveis avanços tecnológicos, tão grandes quanto, no mínimo,
os dos últimos 30 anos.
Com o petróleo custando perto de
US$ 100/barril, os altos investimentos nas águas profundas estariam justificados. Prevê-se que a extração no
novo campo marítimo seria de US$
30/barril. Hoje, a Petrobras retira a
US$ 8/barril. Em contraste, o petróleo saudita custa US$ 2/barril.
No seu mais recente livro, "A Era da
Turbulência", o lendário ex-presidente do Federal Reserve Alan
Greenspan considera baixa a probabilidade de mudanças nos fundamentos
da oferta/demanda do petróleo.
Ademais, o Brasil poderia, verdadeiramente, alcançar a proclamada
auto-suficiência, eis que já estamos
importando mais de 15% do petróleo
cru consumido, com déficit de conta
de US$ 5 bilhões, neste ano.
A fim de atender ao consumo brasileiro, são precisos mais de 2,1 milhões
de barris/diários, e a produção média
é de 1,8 milhão. Quanto ao uso dos derivados, a capacidade de refino da Petrobras está exaurida e, assim, estamos importando o equivalente a 200
mil barris/diários, impactando o balanço de pagamentos, sobretudo nafta, GLP (gás de botijão) e óleo diesel,
cujo consumo superará 42 bilhões de
litros em 2007. A exaustão e a modernização das refinarias no mundo todo
avançam em ritmo muito lento.
Consoante a tabela publicada pela
BP, o Brasil é o 11º consumidor do petróleo mundial, ao lado de Itália e Reino Unido. Para os técnicos que participaram da equipe responsável pela
descoberta do primeiro campo comercial de Campos (RJ), a capacidade
da reserva é prematura. Trata-se, segundo eles, de uma reserva provável,
e não de uma reserva provada.
O entusiasmo do governo é visto
com cautela, eis que em outras oportunidades as estimativas não se comprovaram, como foi a situação dos
campos de Mexilhão (Santos), Namorado (RJ) e Sergipe. Causou estranheza que a notícia fosse apregoada no
bojo da crise do abastecimento de gás
natural, situação que não será descartada no curto e médio prazos.
Monteiro Lobato, ao escrever "O
Escândalo do Petróleo", em 1937, enfatizava que o petróleo é a soberania e
a dominação de um país. Tê-lo, na expressão do criador do Jeca Tatu, é obter o sésamo abridor de todas as portas. Não tê-lo é ser escravo.
LUIZ GONZAGA BERTELLI é diretor do Departamento de
Infra-Estrutura da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e presidente da Academia Paulista de
História.
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