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VINICIUS TORRES FREIRE
Justiça a torto e a direito
SÃO PAULO - No debate público, o Judiciário não parece muito um poder
da República. Gostamos muito de tripudiar sobre o governo, em especial
sobre gastos, embora consideremos
que a gastança, quando nos privilegia, seja direito adquirido e eterno.
Apreciamos o vilipêndio dos "políticos", reação genérica de vilificação
do Congresso, apesar dos pesares, o
Poder mais aberto ao escrutínio público e à escolha dos cidadãos.
O Judiciário, porém, tem ar de seita
misteriosa e invisível, caricatura reforçada até pelo latinório e becas e togas. Mas a Justiça vem de sair do armário em questões memoráveis.
O Supremo Tribunal Federal decidiu que o controle público do Judiciário é para valer: o Conselho Nacional
de Justiça pode sim acabar com a nomeação de parente de juiz. No caso
de triste memória, o Tribunal de Justiça paulista absolveu o chefe militar
do massacre do Carandiru.
O reacionarismo da elite judiciária
temperou as decisões. Os Tribunais
de Justiça lutaram vergonhosamente
para manter o nepotismo, na prática
barrado desde a Carta de 1988. Debatem-se para evitar a eleição da sua
cúpula ou a reforma dos processos.
São os mesmos carcomidos que reclamam de calças femininas, se ocupam
de tecnicismos que não passam mais
de chicanas e que se alinham com a
opinião social mais obscurantista.
Decerto, o Judiciário deve ser o Poder mais incontrolável. Isto é, as liberdades estão ameaçadas se a Justiça cai sob influência de governos,
agências enviesadas ou grupos de interesse, como escritórios de advocacia
(tal como o mercado o faz com o
Banco Central), ou do crime, como
indicou a CPI do Narcotráfico.
Mas, enclausurado, o Judiciário
tende a se comportar como qualquer
burocracia, movido pelo próprio interesse, e, no caso, interesse bancado
por muito poder. Mérito de iniciativas do governo Lula, do reformismo
dos jovens juízes e do Supremo, o Judiciário começa a sair da sua letargia
quase medieval, de seu patriarcalismo e patrimonialismo.
@ - vinit@uol.com.br
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