São Paulo, segunda, 20 de julho de 1998

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REELEIÇÃO EM SÉRIE

A decisão do Partido Justicialista da Argentina de tentar habilitar a terceira candidatura Carlos Menem, proibida pela Constituição argentina, parece refletir certas tendências continuístas na política da América Latina. A convenção do partido sancionou na sexta-feira passada uma moção para que seus líderes solicitem à Justiça permissão para que o chefe de Estado volte a se candidatar. Dezenas de delegados contrários à reeleição não compareceram.
A recandidatura parece uma oportunidade democrática de o eleitorado reconduzir um bom governante ao poder. Mas a permanência prolongada pode tornar o Estado refém de um grupo político, que pode vir a ser exageradamente tentado a manter o mando. Situação que se agrava com um terceiro mandato.
O menemismo espera conseguir a autorização na Corte Suprema de Justiça, cujos membros, em sua maioria, têm sido acusados de "permeáveis" a desejos oficiais, por serem ligados ao presidente.
Outra opção da qual Menem poderá lançar mão é o Congresso. Os parlamentares governistas poderiam tentar alterar a Constituição de 94, mas o presidente não teria os votos suficientes para aprovar mudanças e só o conseguiria com expedientes pouco democráticos. Sem tradição em democracia, a América Latina ainda vive entre instabilidade e tentações até autoritárias de continuísmo.
No Chile, parlamentares eleitos ainda compartilham o Senado com os vitalícios biônicos. O Paraguai esteve recentemente sob ameaça de golpe. O Peru é outro exemplo de regime híbrido, sob o comando do autoritário Alberto Fujimori. Como seu colega argentino, Fujimori manobra para permanecer no poder, candidatando-se novamente no ano 2000.
Parecem exemplos de que, na América Latina, é preciso cuidado para que a recondução de governantes não degenere em ilegalidades e mesmo golpes. Num subcontinente em que a rotatividade democrática no poder não é uma prática sedimentada, o continuísmo ainda pode suscitar novas formas de autoritarismo.



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