São Paulo, segunda-feira, 20 de setembro de 2004

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FERNANDO RODRIGUES

Um DNA abúlico

BRASÍLIA - Mesmo sem idéias objetivas a apresentar, o evento DNA Brasil teve méritos. Reuniu por dois dias e meio 46 personalidades de várias áreas para discutir o país nos próximos 50 anos. Evidenciou como esta nação é incapaz de refletir para valer sobre si própria.
Realizado na semana passada em Campos do Jordão, o evento produziu indagações. "É importante saber se o Brasil agora virou capitalista mesmo", sugeriu o brazilianista Albert Fishlow. Silêncio eloqüente. Ninguém arriscou responder.
"Eu acho que um dos locais em que o país inteiro se encontra é na televisão. Gostaria muito de discutir a televisão", disse a atriz Regina Casé. Boa proposta. Mas só se ouviram as críticas rasteiras de sempre sobre como a mídia domina (sic) a sociedade.
Num dado momento do encontro DNA Brasil os presentes deveriam fazer algum tipo de proposta concreta. Algo que gostariam de ver implantado no país. Liberação das drogas, mais imposto para aumento de investimentos em educação, estatizar os bancos, enfim, valia qualquer coisa. Ninguém habilitou-se a apresentar uma idéia formatada de maneira a ser votada pelos demais.
Foi um debate aflitivo. De maneira involuntária, um dos diálogos resumiu à perfeição os 504 anos de história brasileira. O fazendeiro Luiz Hafers falou com entusiasmo: "Temos de distribuir riqueza". Na lata, o coordenador do painel, o empresário Ricardo Semler, pediu mais objetividade: "Distribuir como? Podemos tomar uma parte da sua fazenda?". Mudou-se de assunto.
A idéia é que esse encontro seja anual. Mal não fará. Servirá de termômetro sobre a (in)capacidade de formulação dos "pensadores representativos" do país, como foram descritos os presentes. No evento inaugural, a catatonia intelectual contrastou com o axioma da propaganda lulista, segundo a qual "o melhor do Brasil é o brasileiro". No caso dos convidados do DNA Brasil, o slogan só vale se não for necessário pensar em coisas práticas e exeqüíveis.


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