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RUY CASTRO
A voz essencial
RIO DE JANEIRO - Por volta de
1950, a música popular passava por
uma importante transformação: o
fim das grandes vozes e a instauração dos cantores suaves, sem vibrato, mais "naturais", estimulada pela alta fidelidade das gravações em
fita magnética. No Brasil, essa tendência não foi logo percebida. Tanto que, naquele ano, o crooner de
um promissor conjunto vocal foi
demitido da Rádio Tupi por cantar
"muito baixinho", não ter extensão
nem volume de voz.
O conjunto era Os Garotos da
Lua, e o crooner, Jonas Silva, 22
anos. Por sua causa -segundo o diretor artístico da rádio, Antonio Maria-, o grupo inteiro tinha de cantar baixinho e, com isso, "ninguém
ouvia nada". Veio o ultimato: ou o
conjunto trocava de crooner, ou
iam todos demitidos. Por mais que
gostassem de Jonas, seus amigos
-pernambucanos, como ele, e
baianos recém-chegados ao Rio-
gostavam mais ainda de almoçar e
jantar. Daí, o sacrificaram.
Para seu lugar foram buscar na
Bahia um jovem capaz de soltar a
voz e cantar até Carnaval: João Gilberto, 19 anos, fã de Orlando Silva e
Lucio Alves. O novo cantor deu conta do recado. Mas, tempos depois,
já fora do conjunto, João Gilberto
também decidiu reduzir sua voz ao
essencial, e seria com este jeito contido de cantar que, em 1958, ele faria a bossa nova.
Jonas conservou (para sempre)
os ex-colegas como amigos. Inclusive João Gilberto, a quem recebeu
no Rio como um irmão. Sua curta
carreira solo teve algum prestígio e
nenhum sucesso. E nunca se ouviu
dele uma palavra contra seu sucessor por ter se consagrado com um
estilo parecido com o seu. Jonas até
ria quando as pessoas, ao escutar
suas gravações de "Amor Certinho"
ou "Pra Que Discutir com Madame?" (muito anteriores às de João),
o acusavam de estar imitando João
Gilberto. Ele era assim.
Jonas Silva morreu neste domingo, no Rio, aos 82 anos.
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