São Paulo, Domingo, 21 de Março de 1999
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O MEDO TRIBUTÁRIO

No final de 1993, sob a ambiciosa denominação "Plano de Ação Imediata", o governo anunciava uma estratégia de ajuste fiscal que, se bem sucedida, criaria as bases para a estabilização de preços e a retomada do desenvolvimento. Pouco mais de cinco anos depois, o ajuste depende ainda de remendos e a reforma tributária continua guardada na gaveta.
Durante muito tempo falou-se em "custo Brasil", em que o peso e a ineficiência dos impostos figuram com destaque. A aprovação, na semana passada, da CPMF, um discutível imposto que se tornou indispensável, ao lado de outras alterações recentes no IOF, no IPI e no ICMS, apenas torna mais evidente a tragédia do sistema tributário brasileiro.
Infelizmente, mais uma vez parece que o tema da reforma tributária volta à cena movido mais por interesses políticos imediatos. O PFL pressiona pela prioridade do tema na agenda das iniciativas do governo federal.
Ora, o problema não é apenas de falta de debates ou propostas. O que falta, há anos, apesar do discurso oficial, são condições políticas para enfrentar o que talvez seja o nó górdio da reforma tributária: o pacto federativo, isto é, a questão da distribuição de recursos arrecadados e das responsabilidades dos governos federal, estaduais e municipais.
Tecnicamente, há um relativo consenso quanto aos princípios gerais de uma ampla reforma tributária.
Ela deve ser neutra, não pode resultar em aumento da carga tributária.
Ela deve resultar na simplificação e racionalização do sistema de impostos, que hoje não passa de um insuportável cipoal que é fruto de décadas de casuísmos.
Ela deve favorecer a cobrança de impostos não declaratórios, cuja arrecadação é relativamente automática ou menos sujeita à sonegação.
Enfim, a reforma deve criar um sistema em que seja mais fácil produzir e aumentar o nível de emprego.
As dificuldades são de ordem política. É ingênuo apostar numa reforma rápida. Além dos vários níveis de governo envolvidos, a reforma afeta interesses de todos os setores da economia. É também um dos pilares da cidadania, já que a reforma deve respeitar critérios de equidade social. Mediar e moderar tantos interesses é tarefa complexa e demorada.
Resta saber por que o governo, que há anos discursa sobre o "custo Brasil" e a reforma tributária, fica imóvel e abusa dos remendos fiscais.
É possível que, pura e simplesmente, o governo federal tenha medo. Medo sobretudo de governos estaduais e municipais que, nos últimos anos, cederam em várias áreas, privatizando, incentivando empresas, sofrendo os efeitos de juros elevadíssimos sobre suas dívidas.
Abrir de fato uma longa negociação com esses governos, num momento de fragilidade política e econômica, talvez seja uma estratégia que o Planalto considere arriscada demais.


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