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São Paulo, segunda-feira, 21 de abril de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

Saddam e Saddans

RIO DE JANEIRO - Entre as inúmeras qualidades que me faltam, a de bom fisionomista é a que mais me deu problemas e vexames. Sou incapaz de guardar caras e de associá-las aos nomes a que têm direito.
Apesar disso, não sendo minha especialidade e levando em conta a má qualidade dos vídeos que nos chegam do Iraque, não engoli aquele Saddam que andou aparecendo antes e depois da queda de Bagdá.
O verdadeiro Saddam, como todas as personalidades fortes para o bem ou para o mal, tem um ímã que concentra o olhar de quem o vê. Como certos atores, Marlon Brando ou Jean Gabin, para citar dois núcleos de feixes que nos obrigam a distingui-los mesmo no meio de uma multidão.
Hitler, Stálin, Churchill, Mussolini, John Kennedy, Khruschov e o marechal Tito eram também personalidades fortes, sem que isso represente um julgamento de valor.
Mas o Saddam que apareceu no meio de iraquianos para provar que ainda está vivo é um sujeito flácido, excessivamente maquiado, falta-lhe massa corporal.
Deve ser um sósia, para irritar Bush, que também não tem massa alguma; se arranjar um sósia, este será mais autêntico que o original.
Uma guerra também é feita com propaganda, e os norte-americanos não ganharam apenas a guerra no front, mas na mídia internacional, embora tenham perdido a guerra mais importante, que é a política.
Com menos recursos, o Iraque fez o que pôde e descolou um sósia de Saddam para chatear os inimigos. É possível que o verdadeiro esteja vivo, mas não dará sopa de aparecer no meio de uma multidão, onde poderia ser morto por um dissidente ou mesmo um iraquiano a soldo da CIA.
A Guarda Nacional que o protegia estava infiltrada de agentes que transmitiam ao comando da coalizão os locais onde o ditador estaria. Por isso, fica difícil crer na autenticidade daquele Saddam que lembra os velhos atores do teatro de revista que imitavam Getúlio Vargas.


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