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CARLOS HEITOR CONY
Saddam e Saddans
RIO DE JANEIRO - Entre as inúmeras qualidades que me faltam, a de bom
fisionomista é a que mais me deu
problemas e vexames. Sou incapaz de
guardar caras e de associá-las aos nomes a que têm direito.
Apesar disso, não sendo minha especialidade e levando em conta a má
qualidade dos vídeos que nos chegam
do Iraque, não engoli aquele Saddam
que andou aparecendo antes e depois
da queda de Bagdá.
O verdadeiro Saddam, como todas
as personalidades fortes para o bem
ou para o mal, tem um ímã que concentra o olhar de quem o vê. Como
certos atores, Marlon Brando ou Jean
Gabin, para citar dois núcleos de feixes que nos obrigam a distingui-los
mesmo no meio de uma multidão.
Hitler, Stálin, Churchill, Mussolini,
John Kennedy, Khruschov e o marechal Tito eram também personalidades fortes, sem que isso represente um
julgamento de valor.
Mas o Saddam que apareceu no
meio de iraquianos para provar que
ainda está vivo é um sujeito flácido,
excessivamente maquiado, falta-lhe
massa corporal.
Deve ser um sósia, para irritar
Bush, que também não tem massa alguma; se arranjar um sósia, este será
mais autêntico que o original.
Uma guerra também é feita com
propaganda, e os norte-americanos
não ganharam apenas a guerra no
front, mas na mídia internacional,
embora tenham perdido a guerra
mais importante, que é a política.
Com menos recursos, o Iraque fez o
que pôde e descolou um sósia de Saddam para chatear os inimigos. É possível que o verdadeiro esteja vivo,
mas não dará sopa de aparecer no
meio de uma multidão, onde poderia
ser morto por um dissidente ou mesmo um iraquiano a soldo da CIA.
A Guarda Nacional que o protegia
estava infiltrada de agentes que
transmitiam ao comando da coalizão os locais onde o ditador estaria.
Por isso, fica difícil crer na autenticidade daquele Saddam que lembra os
velhos atores do teatro de revista que
imitavam Getúlio Vargas.
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