São Paulo, sexta-feira, 22 de março de 2002

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CLÓVIS ROSSI

Crime por omissão

MONTERREY (México) - É espantosa a passividade com que a comunidade internacional acompanha o processo de derretimento de um país chamado Argentina.
O mundo mandou cerca de 6.500 representantes para Monterrey para discutir o financiamento do desenvolvimento, mas é incapaz de mover um dedo para ajudar uma Argentina que precisa de algo muito mais urgente e dramático: financiamento para a sobrevivência.
Fiz ontem uma pergunta com esse espírito aos chefões das quatro grandes organizações internacionais (ONU, Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial e Organização Mundial do Comércio). Todos manifestaram a sua mais profunda simpatia pelo drama do país, mas lavaram as mãos e jogaram a batata quente na panela dos próprios argentinos.
"Sabemos que a situação é muito difícil. Estamos preocupados com a crise social. Mas ninguém tem um remédio rápido para uma situação tão complexa. A verdadeira responsabilidade é dos próprios argentinos", diz, por exemplo, Horst Koeller, diretor- gerente do FMI.
Ora, o Fundo cansou-se de financiar os governos de Carlos Menem e de Fernando de la Rúa, que foram, afinal, os que jogaram a Argentina nessa "situação tão complexa" e nessa "crise social".
Sem o respaldo do FMI (e dos países desenvolvidos) ao modelo cambial que arruinou a Argentina, os próprios argentinos teriam sido obrigados a procurar antes e com menos pressão as respostas que agora não encontram em parte alguma.
O engraçado é que Mike Moore, diretor-geral da OMC, disse em seu discurso na conferência de Monterrey que "a pobreza, em todas as suas formas, é a maior ameaça individual à paz, à democracia, aos direitos humanos e ao ambiente. É uma bomba de tempo contra o coração da liberdade".
Pois bem: a Argentina está produzindo pobreza a cada minuto, não a cada dia, a cada mês ou a cada ano. E os donos do mundo ficam olhando. Dá para levá-los a sério?


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