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CLÓVIS ROSSI
Até tu, Gabeira?
SÃO PAULO - Sou um admirador
de Fernando Gabeira desde muito
antes de seu envolvimento com a
política partidária. É um extraordinário repórter, escreve muitíssimo
bem -e quem, como eu, vive há 45
anos de fazer reportagens e escrever (não tão bem quanto ele), só pode admirar os mestres.
Na política, ele manteve alta a cota de admiração, pelo que diz, pelo
que faz, pelas teses que levanta, pela
combinação de sensatez e firmeza
com que as defende.
Por tudo isso, imaginei que ao
menos ele não se deixaria levar pela
onda de abusos que toma conta do
Congresso Nacional.
Os mais condescendentes dirão
que o pecado de Gabeira (usar passagens da Câmara para parentes) é
menor. Dirão também que ele admite o que chama de "erro".
De acordo, é melhor do que a absoluta e indigna cara-de-pau que
vestem todos os demais pilhados
em algum tipo de irregularidade,
em geral bem mais gorda.
O triste no caso Gabeira é o que
revela da, digamos, cultura da Casa. Os congressistas habituaram-se,
primeiro, com privilégios de corte,
que não fazem o menor sentido.
Depois, como decorrência do anterior, habituaram-se a abusar até dos
privilégios.
Já escrevi aqui que o que os mortais comuns consideramos absurdo, obsceno, cínico, revoltante, os
congressistas consideram normal
-e, pior, espantam-se ou se revoltam com o espanto e a revolta de
massa de nós outros.
Não creio que Gabeira tenha usado indevidamente passagens para
parentes por má-fé. Errou porque
está inserido em uma cultura podre. É preciso estar muito alerta para não cair em erro.
Agora, anuncia a renúncia à política se não conseguir derrubar alguns dos privilégios dos congressistas. Uma colossal maioria de brasileiros já renunciou à política faz
tempo. Não resolve nada, mas que
dá vontade, dá.
crossi@uol.com.br
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