São Paulo, quinta-feira, 22 de abril de 2010

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CARLOS HEITOR CONY

Melancolia de um carioca

RIO DE JANEIRO - Os 50 anos de Brasília abafaram outro acontecimento histórico, que não foi lembrado nem comentado: a criação do Estado da Guanabara. Sua vida curta ainda não foi devidamente estudada, mas quem viveu aquele tempo tem não apenas saudade mas certa irritação pelo fato de os militares terem acabado com ele, promovendo a fusão com o antigo Estado do Rio .
O único defeito do natimorto Estado da Guanabara foi que nos tornou, nós, os cariocas, guanabarinos. Fora isso, foram poucos anos em que as coisas funcionaram muito bem para nossos lados. Tivemos dois governadores-prefeitos de dar inveja aos demais: apesar de inimigos ferozes um do outro, Carlos Lacerda e Negrão de Lima foram de longe os melhores e maiores administradores da cidade-Estado.
Havia razão para isso. A Guanabara ficava com os impostos municipais e estaduais -fazendo caixa único, houve recursos e mentalidade para grandes obras. A ajuda federal foi fracionada e formal. Não contou realmente para as grandes transformações que se seguiram: túneis,viadutos, abastecimento de água, aterros,investimentos na infraestrutura.
Politicamente, o novo Estado marcava-se pela independência em relação ao poder central, daí a necessidade do regime militar de acabar com aquele foco de resistência. A fusão até hoje é chorada pelos cariocas, não por menosprezo a seus vizinhos fluminenses. O carioca Machado de Assis, que viveu antes de tudo isso, dizia com orgulho: "Afinal, somos todos fluminenses". Em termos de futebol, até hoje sou Fluminense.
Aqueles que viveram o breve tempo da Guanabara têm saudade. Meu irmão guardou até a morte a placa do seu carro, um valente Fusca verde-amazonas, com as iniciais GB: fomos felizes e sabíamos que éramos felizes.


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