São Paulo, terça-feira, 22 de maio de 2001

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CLÓVIS ROSSI

O grito dos armários

SÃO PAULO - Seria fácil, até tentador, esculhambar o governo e o presidente da República a partir das informações da revista "Veja" a respeito do caso Marka.
Afinal, hoje é popular bater em FHC, sem mencionar o fato de que a indignação que pinga em quantidades industriais na minha caixa de correspondência eletrônica torna razoável supor que, se eu escrevesse que foi o gado da fazenda de FHC em Buritis que contaminou com a aftosa o rebanho gaúcho, todo mundo acreditaria, e choveriam aplausos.
Mas cuidado! O texto de "Veja" não fecha. Se o banqueiro Salvatore Cacciola tinha informações privilegiadas e ainda por cima um esquema de grampo no Banco Central, como explicar que ele tenha sido surpreendido pela desvalorização do real? A única explicação da revista, assim mesmo de passagem, é a de que não houve tempo para avisá-lo. Dada a sofisticação do esquema denunciado, chega a ser risível.
O presidente e o governo são, então, inocentes? Aí é que mora o problema. Não dá para inocentar o governo nem quando as informações que supostamente o incriminam não fecham.
O socorro aos bancos Marka e FonteCindam foi uma barbaridade intolerável, tenha ou não havido chantagem. Não dá para acreditar que, se um banquinho merreca como o Marka quebrasse, haveria o famoso "risco sistêmico", que arrastaria todo o sistema financeiro tupiniquim, conforme a desculpa dada à época.
É difícil estabelecer o que é pior: render-se a uma chantagem, como diz a "Veja", ou promover a queima de US$ 1,6 bilhão por absoluta incompetência ou por ideologia (a crença de que não ofender o sistema financeiro é a pomada maravilha que cura todos os problemas).
Em qualquer caso, fica provado que esqueletos nos armários nunca param de gritar.


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