São Paulo, terça-feira, 22 de maio de 2007

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CLÓVIS ROSSI

Fisiologia, a mãe da corrupção

PARIS - Para entender melhor como nascem os grandes trambiques que acabaram por se transformar no pão de cada dia da política brasileira, basta ler a nota em que o ministro da Justiça, Tarso Genro, separa "uma relação fisiológica" das relações "delituosas".
O ministro se diz preocupado em evitar que políticos cujos nomes aparecem em certas listas, ao lado de um valor em dinheiro, sejam tomados como delinqüentes, quando pode ser que estejam na relação "apenas" por causa de liberação de emendas ao Orçamento, ou seja, por conta da fisiologia.
A preocupação em si é legítima. Mas revela, ao mesmo tempo, a cultura política que dá origem a quase todos os trambiques com dinheiro público.
Antes de chegar ao poder, aliás, o PT era o que mais gritava -e com razão- contra o "fisiologismo".
Agora, um de seus expoentes, sempre candidato frustrado a ideólogo, é o primeiro a aceitar que a fisiologia é a moeda corrente do jogo político-parlamentar.
A fisiologia, na prática, significa o seguinte: o parlamentar usa dinheiro público para fazer o seu nome junto ao eleitorado, levando supostamente uma obra qualquer para sua região. Em troca, o governo que liberou o dinheiro (repito, dinheiro público, não do governo) passa a contar, pelo menos em tese, com o voto do parlamentar ou, no mínimo, com a sua mansidão em relação a comportamentos indevidos de autoridades.
Se a obra é de fato necessária, não seria necessária a barganha fisiológica. Se não é, trata-se no mínimo de desperdício de recursos públicos, aliás muito escassos. Esse varejo político que se fortalece governo após governo é a mãe de relações incestuosas entre o governo e os parlamentares e entre estes e o setor privado. Ao tratar com condescendência a fisiologia, o ministro da Justiça só reforça o incesto, que leva ao delito.


crossi@uol.com.br

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