São Paulo, domingo, 22 de maio de 2011

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Presente, futuro e psicanálise

PLINIO MONTAGNA


A psicanálise continua sendo, com seus avanços, poderosa arma terapêutica de ampliação do conhecimento sobre cada um e sobre relações humanas


Como dispor do tempo que ainda viveremos -esse é nosso desafio, universalmente humano. Vale para qualquer idade e qualquer tempo, desconhecido, que a vida nos reservará. O presente é o fim e o início de dois tempos, passado e futuro, e é nele, no trânsito entre nossas recordações e nosso destino, que temos o nosso dizer e fazer.
O futuro se ancora nas escolhas que fazemos hoje, dentre aquilo que a vida nos apresenta e nossas criações próprias. Vivê-lo com qualidade ou jogá-lo fora depende de nós. Nos é dado redimensionar e reorganizar em nós o passado, mas, óbvio, não o viveremos mais.
Passado e futuro são referências apenas do presente. É disso que trata uma psicanálise. Diferentemente do que muitos imaginam, o fazer psicanalítico contemporâneo não se refere a falar do passado para entender o presente.
Ao inverso, por meio das formas relacionais que alguém mostra na sala de análise pode-se reconstruir imaginativamente seu passado, não necessariamente o factual, vivido "de fato", mas, sim, a narrativa que dele faz para si mesmo.
Mais do que explicar, refere-se a compreender -ou criar sentidos em que a própria mente é apenas virtualidade, uma protomente.
Mais do que conjeturar o passado, importa configurar graus crescentes de liberdade interior para o indivíduo lidar com o presente e com a trama que imprime às suas relações, se apropriando daquilo que se vai revelando verdadeiro em seu ser. A apropriação de sua singularidade radical, a favor da vida, pode-se dizer o escopo nuclear de um processo analítico.
Não se trata, por exemplo, de uma pessoa não sofrer, mas, sim, de desenvolver seus equipamentos, em auxílio a se desviar dos sofrimentos evitáveis e enfrentar os que não o são. É assim que podemos ajudar. Estamos mais instrumentados que na época de Freud.
Além dos outros grandes mestres, a psicanálise segue, como todo campo de saber, sendo construída num trabalho diário de muitas mãos. Na Associação Psicanalítica Internacional, que Freud fundou, convivem e conversam entre si diversos modos de pensar, sendo natural, num mundo em rede como o nosso, um influenciar o outro.
Mantém-se perspectiva plural, para a maioria, por vezes pluralista.
A psicanálise representa hoje a peça de resistência do estudo da subjetivação e da subjetividade humana e segue tendo enorme influência em inúmeras outras áreas.
Continua sendo, com seus avanços, uma poderosa arma terapêutica de ampliação do conhecimento sobre cada um e sobre relações humanas.
Possibilitando a atualização de sua existência a cada um, permanece como uma ferramenta preciosa na busca de uma vida psíquica de qualidade. Como cada um de nós, ela não está pronta, fechada em seu saber e fazer. Influencia e é influenciada pelo tempo e pelo espaço que a circunda.

PLINIO MONTAGNA, mestre em psiquiatria, psicanalista, é presidente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP), membro componente da Associação Psicanalítica Internacional. Foi docente da Faculdade de Medicina da USP.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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