São Paulo, sexta-feira, 22 de junho de 2007

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Sigilo ameaçado

É PÉSSIMA a iniciativa da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) de permitir que operadoras e seguradoras tenham acesso indiscriminado a dados sigilosos do paciente. Isso ocorre porque a ANS introduziu um novo modelo de guia de exames, consultas e internações no qual há um campo para que o médico coloque o diagnóstico do paciente, e as informações constantes deste documento podem circular entre operadoras, médicos e hospitais.
O diagnóstico é um dado constitucional e legalmente protegido por sigilo. O médico que o divulga sem autorização do paciente pode ser processado nas esferas civil e penal. Resolução recente do Conselho Federal de Medicina (CFM) proíbe seus profissionais de preencher a guia com o CID, o código da doença no sistema internacional de classificação de moléstias.
A preocupação do Conselho se justifica. Sabe-se que algumas operadoras costumam glosar procedimentos de pacientes "gastadores" e até descredenciar médicos que requisitam exames caros. Acesso fácil ao diagnóstico de cada cliente potencial é tudo de que elas precisam para elaborar "listas negras", isto é, identificar portadores de certas doenças crônicas e impedi-los até mesmo de contratar um plano.
Também é estranha a justificativa da ANS para a mudança no modelo de guia. Ela alega que a inclusão do diagnóstico permitirá a geração de um banco de dados muito útil para estudos epidemiológicos. É verdade. Só que esse gênero de pesquisa dispensa a identificação do paciente. Basta que o médico notifique a doença à ANS ou a qualquer outra instância competente.
As operadoras têm por certo o direito e até o dever de combater fraudes e evitar gastos desnecessários. Devem estar atentas a casos que fogem ao padrão e investigá-los, o que, por vezes, exige questionar o médico e eventualmente inquiri-lo sobre o diagnóstico do paciente. Essa, entretanto, é uma tarefa que cabe ao médico auditor contratado pela operadora, que também tem o dever legal de guardar sigilo. Não são informações públicas que possam cair nas mãos de administradores e corretores.
Dessa história toda fica a suspeita de que a ANS anda se aproximando demais das operadoras.


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