São Paulo, segunda-feira, 22 de junho de 2009

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RUY CASTRO

Secular tranquilidade

RIO DE JANEIRO - Em 1565, depois de cinco anos de guerra feroz, os portugueses, comandados por Estácio de Sá e reforçados pelos índios temiminós, tomaram o morro Cara de Cão, vizinho ao Pão de Açúcar, derrotando os franceses e os tupinambás. E, para não deixar dúvida, fundaram ali a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. A futura Urca começou bem.
Seguiu-se certo sossego, perturbado apenas pelos ataques de corsários ao Rio no século 18, defendidos pelos canhões da fortaleza de São João, no mesmo morro. Em 1922, com a urbanização do bairro, construiu-se um lindo balneário junto à prainha da Urca, a qual precisou de uma injeção de areia para comportar as multidinhas que começaram a frequentá-la.
Em 1933, o balneário deu lugar ao Cassino da Urca, logo um marco turístico nacional. Navios inteiros vinham apostar em suas roletas e ouvir Carmen Miranda. Mas, em 1946, Dutra fechou os cassinos e, em 1951, o prédio passou à TV Tupi, cujos selvagens programas comandados por Chacrinha, Flavio Cavalcanti e J. Silvestre nos anos 60 atraíam milhares de pessoas ao seu auditório.
A Tupi faliu em 1980 e entregou um prédio em ruínas, que, fechado pelos anos seguintes, tornou-se um nojento mictório e ninho de traficantes, drogados e vadios. Em 2003, a prefeitura cedeu-o ao IED (Istituto Europeo di Design), e este começou um delicado trabalho de restauração do projeto original, para instalar ali uma escola de artes visuais, design e moda, como a de sua filial em São Paulo.
Não será mais possível. Alguns moradores da Urca insurgiram-se contra o IED e, com os votos dos vereadores cariocas, embargaram a obra, já bem avançada. Alegam que a multidão de estudantes de design, moda e artes visuais atraída pela escola irá perturbar a secular tranquilidade da Urca.


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