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TENDÊNCIAS/DEBATES
Por que Bush prioriza o Iraque?
CARLOS DE MEIRA MATTOS
Na sua declaração de guerra total
ao terrorismo internacional, manifestada no calor da exaltação psicológica produzida pelos ataques às torres
do World Trade Center e ao Pentágono,
o presidente Bush discriminou o "eixo
do mal" como sendo o Iraque, o Irã e a
Coréia do Norte. Desde então, o presidente dos Estados Unidos vem acentuando a sua principal preocupação
com o Iraque de Saddam Hussein, a
ponto de seus porta-vozes políticos e
militares terem divulgado planos de
ataque militar contra o Iraque, a fim de
destituir o seu governante do poder.
O governo de Washington prioriza
uma ação militar para destituir Saddam
Hussein porque está convencido de que
esse ditador está empenhado em fabricar no país armas de destruição em
massa (químicas, biológicas e físseis),
fato que, aliado à sua já reconhecida irresponsabilidade (invasão do Kuwait
em 1991), representa uma grave ameaça
para os Estados Unidos e para a paz
mundial. Não resta dúvida de que, se algum país ou seita política começar o uso
de armas de destruição em massa, será
quase impossível conter o processo de
generalização de seu emprego. Estaremos diante de uma catástrofe apocalíptica de dimensões incalculáveis.
As preocupações do presidente Bush
com o Iraque estão relacionadas com
fatos concretos, que podem ser assim
resumidos: em 1998, a Comissão de Inspeção da ONU e a Agência Internacional de Energia Atômica, encarregadas
de inspecionar o território do Iraque, a
fim de impedir a fabricação de engenhos de destruição em massa (de conformidade com o tratado assinado pelo
governo de Bagdá no final da Guerra do
Golfo), foram expulsas do país, depois
de um período de atritos crescentes
com as autoridades iraquianas, em virtude das medidas restritivas impostas à
sua ação fiscalizadora.
Durante a permanência das referidas
comissão e agência no Iraque, de 1991 a
1998, o governo de Bagdá usou toda sorte de ocultação e fraudes para dificultar
o cumprimento de sua missão.
A "gota d'água", que resultou na retirada dos órgãos fiscalizadores do Iraque, foi a descoberta do projeto de expansão da fabricação do VX, um agente
químico letal, de ação no sistema nervoso, apto a ser utilizado como arma de
destruição em massa. O governo de
Bagdá impediu a movimentação dos órgãos de inspeção da ONU e, a partir daí,
a crise evoluiu para a expulsão.
Desde então, diversas negociações visando assegurar condições para o retorno desses órgãos inspetores têm fracassado, diante das condições impostas
por Saddam Hussein. Durante estes últimos quatro anos, livre de qualquer fiscalização internacional, há indícios sérios de que o governo do Iraque aumentou substancialmente o seu arsenal de
armas de destruição em massa, inclusive de engenhos de fissão nuclear.
Há indícios sérios de que o Iraque aumentou substancialmente o seu arsenal de armas de destruição em massa
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A intenção comprovada de expandir
um programa de armas de destruição
em massa, a posse e fabricação de mísseis transportadores desses engenhos,
as suas atitudes não-conciliatórias e as
provas de que apóia com recursos financeiros organizações terroristas que
atuam na Palestina, no Afeganistão e no
Paquistão fazem do ditador iraquiano,
naturalmente, o alvo principal da estratégia antiterrorista de Washington.
Saddam Hussein, mais uma vez (como aconteceu em 1991, quando invadiu
o Kuwait), não se mostra sensível à negociação diplomática nem às pressões
dos bombardeios esporádicos de seu
país pelos aviões norte-americanos e ingleses. Por isso, a Casa Branca tem se revelado favorável à solução militar.
Várias vezes o presidente Bush anunciou o início de uma ação militar para
derrubar Saddam do poder. Várias vezes adiou esse início, porque não há
acordo entre os seus aliados, além do
que os países árabes unanimemente desaprovam a solução militar -também
a Rússia e a China. Agora, por último,
surgiram no próprio partido de Bush, o
Republicano, grupos que se opõem à
solução militar. Contrariando essas manifestações antibélicas, a principal assessora da Casa Branca para a Segurança, Condolessa Ricci, declarou recentemente à BBC que, diante das provas já
existentes, os Estados Unidos não podem continuar esperando até serem envolvidos por novas agressões.
Esta a encruzilhada diplomática e estratégica que enfrenta Bush.
Carlos de Meira Mattos, 89, general reformado
do Exército e veterano da Segunda Guerra Mundial, é doutor em Ciência Política e conselheiro
da Escola Superior de Guerra.
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