São Paulo, sexta-feira, 22 de outubro de 2004

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CLÓVIS ROSSI

A vitória do medo

LISBOA - O governo Luiz Inácio Lula da Silva segue, em matéria econômica, o mesmo caminho de seu sucessor, que era "maldito".
O governo Luiz Inácio Lula da Silva não consegue, nas políticas sociais, controlar os recursos que destina (ou deveria destinar) até mesmo aos programas mais acarinhados pelo próprio presidente da República, como ficou claro no caso dos desvios constatados pela Rede Globo no Bolsa-Família.
Agora, o governo Luiz Inácio Lula da Silva dá as costas também a princípios que deveriam ser básicos, essenciais. Refiro-me, outra vez, ao redivivo caso Vladimir Herzog.
Primeiro, tentar pôr ponto final ao assunto com uma nota-retratação do comandante do Exército é um equívoco. Não dá, nesse caso, para dizer "esqueçam o que o Exército escreveu" (na primeira nota). Houve um erro brutal de conceitos e, além disso, açodamento confesso, na medida em que a segunda nota diz que não houve a devida discussão interna.
Pior do que isso, no entanto, é dar como boa a segunda nota, na qual se afirma que o primeiro comunicado não era "condizente com o momento histórico atual".
Não, não é nada disso. A primeira nota e a defesa da "legitimidade" da tortura e do assassinato de prisioneiros políticos não é condizente com nenhum "momento histórico", atual, passado ou futuro.
Ou não é uma violência defender torturas em um momento histórico caracterizado pelo desrespeito às liberdades públicas?
O comportamento pusilânime do governo nesse episódio só reforça a tese de que, ao contrário do que dizia a propaganda petista ao término do processo eleitoral de 2002, o medo venceu a esperança.
O medo de fazer uma política econômica que tenha pelo menos um milímetro de imaginação e criatividade. O medo de enfrentar interesses estabelecidos. O medo de defender princípios e valores que são um patrimônio da civilização.


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