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ELIANE CANTANHÊDE
Gilmar, Nardonis e os bodes
BRASÍLIA - A Justiça é cega, surda e muda, mas de mudo Gilmar
Mendes não tem nada. Muito menos na presidência do Supremo.
Gilmar fala -e fala muito. Obstinado (ou teimoso, como dizem seus
amigos), ele mergulhou em duas
cruzadas de caráter inclusive didático. Numa, ficou rouco de tanto falar em Estado de Direito e surdo à
gritaria da opinião pública. Na outra, viajou de Estado em Estado para averiguar e melhorar condições e
procedimentos da Justiça.
A principal marca de sua gestão
são os dois habeas corpus a favor do
banqueiro Daniel Dantas e contra o
que ele chama de "conúbio espúrio
de polícia, juiz e membro do Ministério Público", à frente o delegado
da PF Protógenes Queiroz, imbuído
de um espírito justiceiro que, quanto mais encanta as pessoas, mais
perigoso se torna. Foi o pior momento para Gilmar, mas ele sobreviveu, Protógenes caiu.
Acusado de proteger os bulldogs
num dos países mais desiguais do
mundo, o maior orgulho de Gilmar
foi tentar salvar vira-latas das cadeias pulguentas país afora. Na sua
contabilidade, resgatou 20 mil.
Gente que estava presa sem motivo,
sem defesa, fora de prazo -ilegalmente, portanto. Muitos durante
meses, anos, vidas.
O Brasil muda de patamar em várias áreas, mas precisa de mais determinação para punir desmandos
de poderosos (quem pode pode...) e
poupar desdentados e injustiçados.
Gilmar, porém, está convencido de
que não se resolvem as coisas com
bodes expiatórios, enquanto a opinião pública -como se vê justamente neste momento, com o casal
Nardoni- adora bodes expiatórios
para fingir que somos mais justos.
Na entrevista de Gilmar à Folha
de ontem, sua melhor provocação é
que "às vezes os confrontos são necessários". É verdade. Avanços não
se fazem com bom-mocismo, acomodação e muito menos covardia,
três condições que não cabem em
Gilmar Mendes. Só que isso tem
custo. Ele bem sabe o quanto.
elianec@uol.com.br
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