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CLÓVIS ROSSI
Como ser uma Argentina
ROMA - A avaliação do presidente Fernando Henrique Cardoso sobre o
risco de o Brasil virar uma Argentina
é uma daquelas situações feitas para
criar tempestade em copo de água se
a reação se der apenas em cima dos
títulos dos jornais.
A frase do presidente daria imenso
orgulho ao conselheiro Acácio, aquele das obviedades galopantes. A saber: "Se você não tiver competência
-e eu não quero divulgar quem tem
e quem não tem- e se não tiver respeitabilidade para fazer e coragem
para tomar decisões difíceis, desanda", disse Fernando Henrique.
É o óbvio: sem competência, respeitabilidade e coragem, o país -qualquer país- pode virar não uma Argentina, mas um Afeganistão.
O importante na frase do presidente não é o que está dito, mas o que foi
omitido. A Argentina ruiu não porque introduziu mudanças, mas porque o presidente Fernando de la Rúa
quis manter o status quo.
Quis manter, acima de tudo, o câmbio fixo. Leia-se, por exemplo, o que
escreve o Nobel de Economia de 2001,
Joseph Stiglitz, em artigo reproduzido
no "O Estado de S. Paulo" do dia 13
passado:
"Era um sistema fadado ao fracasso. Taxas de câmbio fixas nunca funcionaram. Nem mesmo os EUA conseguiram conviver com uma taxa de
câmbio fixa, saindo da âncora para o
ouro no meio da Grande Depressão".
Quando convocou para o Ministério da Economia, no ano passado, o
mesmo Domingo Cavallo que havia
criado o modelo de câmbio fixo, De la
Rúa estava demonstrando todas as
condições que FHC vê como conducentes ao fracasso (falta de competência, de respeitabilidade e de coragem). Deu no que deu.
E ensina que, no Brasil pós-eleições,
a melhor maneira de criar uma nova
Argentina é não mexer em tudo o
que está errado -e há um punhado
de coisas a corrigir.
Pretender, como tática eleitoral, insinuar que qualquer mudança levará
ao desastre é, aí sim, falta de coragem
e de respeitabilidade.
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