São Paulo, sexta-feira, 23 de julho de 2004

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CLAUDIA ANTUNES

Penitência sem fim

RIO DE JANEIRO - O presidente Lula prometeu não renovar o acordo com o FMI, que vence em dezembro. Palocci e Meirelles têm repetido que o governo não irá renová-lo. Se o fizer, como tem ocorrido desde 1998, o Brasil cairá na categoria dos que fazem "uso prolongado" de recursos do organismo -reservada a países, geralmente miseráveis, que passam sete de dez anos consecutivos sob a tutela do Fundo Monetário.
Uma vez que ninguém pretende renovar o acordo, que é o que se afirma aos cidadãos, é o caso de perguntar o que faz aqui a missão chefiada pela diretora de Assuntos Fiscais do FMI, Teresa Ter-Minassian. Ontem, ela discutiu em Brasília a proposta de uma nova metodologia de cálculo para o superávit primário que exclua parte dos investimentos da conta de despesas estatais -mas já adiantou que o processo "vai levar algum tempo" e ainda depende de "ações do governo brasileiro".
Pelo tom de Teresa, seu tempo parece ser maior do que os cinco meses que restam até dezembro. Depois disso, o acordo com o FMI deixará de vigorar. O governo, imaginariam os crédulos, poderá então calcular como bem entender o superávit que paga os juros da dívida e manter por conta própria a política econômica que garante adotar por convicção de que é a melhor, sem imposição externa.
Mas não é isso que vai acontecer, pois os cidadãos estão sendo outra vez passados para trás em seu direito à transparência. Mesmo sem informar, a equipe econômica indica que fará tudo, sim, para prolongar a dependência brasileira do aval do Fundo, talvez ressuscitando um tipo de trato pelo qual só tiraria dinheiro em caso de emergência.
Os governantes convertidos à ortodoxia parecem convencidos de que é necessário obter de joelhos no milho uma confiança que não chegará nunca, porque sempre vai haver uma reza a mais na penitência -a última delas é a desvinculação das receitas orçamentárias.


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