São Paulo, sexta-feira, 23 de agosto de 2002

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MARCELO BERABA

O poder paralelo

RIO DE JANEIRO - Assisti nesta semana a um debate sobre violência e exclusão social, promovido pela Prefeitura do Rio, que juntou a antropóloga Alba Zaluar e o escritor Paulo Lins, autor de "Cidade de Deus". Os dois, por vias diversas, conhecem muito bem os temas.
Chamou-me a atenção uma observação feita por Alba Zaluar a propósito de uma pergunta sobre o poder paralelo do narcotráfico no Rio. Para a antropóloga, que fez pesquisas em vários conjuntos habitacionais e favelas do Rio e acompanhou, ao longo das décadas de 70 e de 80, a evolução da criminalidade na cidade, o termo "poder paralelo" é impróprio.
Ao contrário das paralelas, que só se encontram no infinito, o poder constituído e o poder dos comandos do tráfico se encontram diariamente, convivem e se auto-alimentam.
Diferentemente das máfias italianas, que se infiltraram em todos os escaninhos do Estado, o varejo do tráfico no Rio não tem força institucional. Mas corrompe, da mesma forma, um braço do Estado, a polícia, exatamente o que lhe deveria dar combate.
A própria cúpula da polícia do Rio admitiu mais de uma vez o que parece óbvio para todo mundo e o que o atual corregedor já expressou com todas as letras: os principais comandos e seus chefetes têm proteção policial. O esforço de uma parte da polícia para prendê-los esbarra sempre em dificuldades criadas pela banda podre, que empresta segurança, fornece informações e achaca.
E, quando esse relacionamento clandestino lucrativo passa a oferecer uma ameaça para os esquemas montados, os traficantes protegidos são eliminados e repostos. E assim caminha a humanidade.
Quem tem o poder, Elias Maluco ou o esquema que lhe dá proteção? Para que fique mais clara a interseção entre as paralelas, dois livros podem ajudar: "Notícias do Mirandão", de Fernando Molica, e "No Coração do Comando", de Júlio Ludemir, ambos da editora Record.



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