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CARLOS HEITOR CONY
Deus e o diabo
RIO DE JANEIRO - Desde criança
-e bota muito tempo nisso- ouvia
os adultos falarem, com voz sinistra, sobre o dia em que "os morros
ocupariam o asfalto". E olha que os
morros, naqueles distantes idos,
não eram o que são hoje. Eram moradia de gente pobre que chegava à
antiga capital da República para
ganhar a vida.
A favela chegou a ser romantizada pela literatura, pelo cinema e pela música popular. Com a chegada
do tráfico de drogas, elas se transformaram em reduto de bandos e
bandidos, que, aos poucos, foram
substituindo o Estado na administração das necessidades locais.
Tivemos um governador (Leonel
Brizola) que chegou a aceitar a realidade e proibiu que a polícia subisse aos morros. Não adiantou, pelo
contrário, piorou a situação. Somente agora as autoridades resolveram ocupar as favelas com as
UPPs. Em tese seria uma solução.
Mas as raízes da violência urbana
estão entranhadas em grande parcela da população que não encontra espaço na sociedade e no mercado de trabalho.
O tráfico se instalou como um
grupo guerrilheiro. Quando a polícia ataca este núcleo, a luta fica limitada aos dois contendores, polícia e traficante, provocando mortos
e feridos em ambos os lados.
Com a nova tática adotada (com
eficiência) pelo Estado, foi rompida
a trégua entre bandidos e mocinhos, que se limitavam a combater
em determinadas zonas. Em represália, a guerrilha continuou sem
marcação prévia de território. A luta -como os shows- tem de continuar, e a violência se estendeu ao
asfalto. Daí os arrastões. Consta por
aí que os bandidos evitarão matar,
apenas assaltar carros, levando o
que puderem arrecadar.
É uma nova etapa da guerrilha,
na base do ataque inesperado e da
fuga planejada. Deus por alguns e o
diabo por todos.
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