|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CARLOS HEITOR CONY
Sem perder a ternura
RIO DE JANEIRO - Foi há alguns
anos, escrevi uma crônica mais ou
menos severa, criticando não me
lembro qual posição ou atitude do
senador Antônio Carlos Magalhães.
No mesmo dia, recebi dele um fax
também severo, aliás severíssimo,
justificando-se e, ao mesmo tempo,
explicando à maneira dele a minha
crítica.
Dias antes, eu escrevera um texto
lamentando a morte de Mila, uma
setter irlandesa que funcionava como um fio-terra para minhas desditas -que são muitas. ACM atribuiu
minha crônica à falta que Mila me
fazia, dizendo textualmente que se
ela estivesse ao meu lado, não permitiria que eu fosse tão injusto para
com ele.
Eu já ouvira falar no Toninho
Malvadeza e no Toninho Ternura,
mas nunca experimentara um e outro atributo de sua forte personalidade. Pouco depois, ele perdeu o filho e aí fui eu que lhe mandei um e-mail de solidariedade. Nunca o vira
pessoalmente. No dia seguinte, um
sábado, não sei como, ele descolou o
telefone de minha casa, quase não
falou, apenas chorou o tempo todo.
Confesso que fiquei abafado, sem
saber manter o diálogo que não
houve.
Passa o tempo e numa cerimônia
em São Paulo sou apresentado a ele.
Poucas palavras, o abraço dele foi
mais do que um abraço, mas um
afago. Abraço e afago que se repetiram na noite de posse de Zélia Gattai na Academia Brasileira de Letra.
Eu já estava indo embora quando
alguém saiu de seu lugar para vir ao
meu encontro. "Você não vai sem o
meu abraço, eu não esqueço o Luís
Eduardo, você não esquece a Mila."
Outros acadêmicos ouviram o comentário e não entenderam, pensaram que Mila fosse minha filha. Bolas, depois disso tudo, mandei minha isenção às favas, declarei-me
suspeito para falar de ACM. Ele se
mostrara apenas em sua versão de
Toninho Ternura.
Texto Anterior: Brasília - Eliane Cantanhêde: Pan...demônio Próximo Texto: Marcos Nobre: Justiça e política Índice
|