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RUY CASTRO
Erros contra ou a favor
RIO DE JANEIRO - De repente,
jornais e revistas deram para escrever que tal livro ou peça "é sofrível",
querendo dizer que é péssimo, chatérrimo -que faz o espectador sofrer. Mas "sofrível", como sabem os
que não faltaram àquela aula, significa o contrário. É o que, não sendo
grande coisa, ainda é suportável.
Ou, segundo o "Aurélio", "razoável;
acima de mediano". Enfim: sofrível.
Outra mania é a de chamar um
filme de "longa". Como se houvesse
um surto de "curtas" na praça, a
ponto de se precisar distingui-los
dos filmes comuns, de uma hora e
meia, classificando estes de "longas". Mas longas de verdade eram
"E o Vento Levou", "El Cid" ou
"Cleópatra", com três, quatro horas
de duração, e mais o "Canal 100".
Sei de gente que morreu de velhice
durante a sessão. E morreu feliz.
Pelo mesmo motivo, jogos (de futebol) deixaram de ser chamados
de jogos e se tornaram "duelos" ou
"desafios". Fico imaginando um
duelo a floretes no grande círculo
do Maracanã entre Obina, do Flamengo, e Richarlyson, do São Paulo, com o juiz trilando o apito final
ao primeiro sangue. Ou um desafio
repentista entre Alan Kardec, do
Vasco, e Maicosuel, do Palmeiras,
reeditando a peleja do Cego Aderaldo contra o Zé Pretinho, em Pimenteira, no Piauí.
São vícios de escrita, espero que
temporários. Um que ainda está limitado aos locutores de basquete
ou vôlei é dizer que o time xis "se
personalizou" em quadra -ou seja,
reagiu, ganhou "personalidade". De
onde tiraram esse verbo?
Tudo bem, é a "contribuição milionária de todos os erros", como
dizia o outro. Mas só se deviam admitir os erros a favor da língua. Como o proposto, outro dia, por meu
amigo Jorge, do Andaraí. A certa altura da conversa e do feijão com pé
de porco, ele me interrompeu dizendo, "desculpe intervi-lo, mas...".
Gostei, vou adotar.
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