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INSTABILIDADE LATINA
A Bolívia deverá experimentar
dificuldades com a eleição de
Evo Morales, mas a escolha é um sinal de que a democracia funcionou.
O presidente eleito na votação anterior (2002) havia sido Gonzalo Sánchez de Lozada, um legítimo representante da elite descendente de europeus -rico e educado nos EUA. Já
Evo Morales é indígena, da etnia aimará, filho de pais miseráveis. Começou como líder sindical dos plantadores de coca. É um socialista à antiga, a favor de estatizações.
A eleição de Morales já no primeiro
turno lhe deu legitimidade incontestável, poupando o país de uma fonte
de problemas, pois o segundo turno
se daria no Congresso, que poderia
escolher o segundo colocado. O
bom desempenho, contudo, não elimina as dificuldades.
Seu dilema não é muito diferente
daquele vivido pelo PT em 2002. Ou
Morales cumpre a promessa de nacionalizar o setor petrolífero -sua
única "tese" econômica- ou providencialmente a esquece. Na primeira
hipótese, o mais provável é que assuste investidores estrangeiros e os
afaste do país. Sem obter um crescimento econômico perceptível, as
promessas de avanços sociais iriam
por água abaixo. O resultado previsível seriam novos protestos de rua.
Se o novo mandatário, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, optar por esquecer seu passado, provavelmente estará abrindo um atalho
para manifestações que poderiam
debilitá-lo. Felipe Quispe, líder indígena ainda mais radical do que Morales, já disse que não dará mais do
que 90 dias de trégua ao novo presidente, cuja posse é em janeiro.
Na realidade, Morales tem tudo para se comportar mais como um líder
populista clássico do que como o estadista de que o país precisaria para
conciliar seus estamentos socais.
Do ponto de vista continental, a alternância de poder na Bolívia se inscreve na tendência regional de depor
mandatários por meio de protestos,
não raro incentivados por dificuldades econômicas. Em anos recentes,
caíram pelo grito das ruas ao menos
cinco presidentes eleitos: Lucio Gutiérrez (2005) e Jamil Mahuad (2000),
do Equador, Sánchez de Lozada
(2003), da Bolívia, Fernando de la
Rúa (2001), da Argentina, e Alberto
Fujimori (2000), do Peru. Pode-se
acrescentar à lista os casos do paraguaio Raul Cubas (1999), que era vice, e de Carlos Mesa (2005), que
substituiu Sánchez de Lozada.
É um sinal de que as conquistas democráticas latino-americanas ainda
não encontraram um ambiente econômico e social suficientemente estável para se consolidar.
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