São Paulo, segunda, 25 de janeiro de 1999

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Sacrifícios em vão

FERNANDO BEZERRA

O país enfrenta uma situação que ameaça anular os grandes sacrifícios que fizemos todos nós, notadamente os setores produtivos, nos últimos anos, com o propósito de consolidar a estabilidade monetária.
Para tanto, deveríamos, em tempo hábil, ter procurado equilibrar as contas públicas. O governo certamente subestimou a necessidade de enfrentar esse desafio e não soube transmitir à elite política uma mensagem clara. É preciso também reconhecer que a responsabilidade não é apenas do Executivo. Nós, parlamentares, agimos como se fosse possível postergar por mais tempo aquelas reformas de que dependem o equilíbrio fiscal.
Não adianta muito, agora, averiguar e apontar culpados. O essencial é nos darmos conta de que não podemos admitir que se aceite a possibilidade da volta da inflação. O momento exige uma opção clara no sentido de impedir que da liberação do câmbio instaure-se no país um clima de que estamos no caminho da reindexação da economia. De modo algum podemos manifestar alguma espécie de conformismo com esse tipo de expectativa. Ao contrário, urge recuperar a credibilidade do governo para a defesa da estabilidade monetária, perseguindo, sem desfalecimentos, a busca do equilíbrio fiscal.
É perfeitamente possível formularmos um programa realista com vistas a assegurar a transição para voltarmos a dispor de âncoras, não tão danosas à nossa economia, capazes de sustentar o Plano Real.
É preciso ainda dar-se conta da singularidade dos fenômenos negativos com que nos temos defrontado. O desequilíbrio das contas públicas, por si só, não teria gerado a crise com as proporções de que chegou a revestir-se, mas tornou-nos vulneráveis aos efeitos do que ocorreu em outros países.
A experiência do que vem ocorrendo em diversas partes do mundo evidencia claramente que, por enquanto, não há mecanismos institucionais capazes de exercer qualquer espécie de controle sobre os capitais que escolhem, a partir exclusivamente de suas próprias conveniências, quando e em que direção migrar. É uma realidade, associada à globalização, com a qual só nos resta aprender a conviver, enquanto procura-se uma fórmula de controlar os seus efeitos nefastos. Assim, o antídoto com que poderíamos contar limitava-se à eliminação da mencionada vulnerabilidade, além de dar provas da mais ampla e profunda coesão nacional.
Essa união nacional tem que ser alicerçada em torno de objetivos claros, envolvendo a competência e coerência das políticas monetárias e fiscal, de um grande esforço exportador estribado num câmbio real e juros civilizados e da estabilidade da relação da dívida interna líquida com o PIB.
O engajamento da sociedade no processo de superação da crise que nos sufoca em torno de um projeto de desenvolvimento é fundamental para que nosso país não sucumba em meio a esse mar revolto.
Temos um presidente da República recém-reeleito que dispõe de maioria no Congresso, empresários que já provaram sua capacidade de superar terríveis dificuldades com a globalização da economia e trabalhadores que, não obstante as taxas altíssimas de desemprego, têm defendido suas reivindicações de forma ordeira e pacífica.
Não há por que nos afundarmos em apatia e desesperança. Ao contrário, devemos todos, governo, políticos, empresários e trabalhadores, com a colaboração da mídia, procurar a melhor alternativa para o país e lutar para que ela seja efetivamente implantada.
Em diferentes momentos de dificuldades em nossa história recente, muito se falou na necessidade de um governo de união nacional.
Todavia não me lembro de nenhuma outra oportunidade em que essa união fosse tão necessária. Temos que sair dessa perplexidade que assaltou a todos. E devemos fazer isso juntos, com a colaboração consciente de todas as forças vivas da nação.

Fernando Bezerra, 57, empresário, é senador pelo PMDB do Rio Grande do Norte e presidente licenciado da CNI (Confederação Nacional da Indústria).





Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.