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CLÓVIS ROSSI
De direitos e renúncias
SÃO PAULO - Você certamente já
ouviu ou leu recomendações como
estas: "Fique calmo e não corra";
"deixe suas mãos visíveis"; "não faça movimentos bruscos".
Lembra? Claro. São as recomendações da polícia para o caso de você trombar com bandidos. Agora,
saiu uma nova versão. As recomendações são as mesmas, mas servem
para o inverso, ou seja, para o caso
de você trombar com a polícia.
Constarão de 1 milhão de folhetos a
serem distribuídos por meio da Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal.
Há na iniciativa dois problemas.
Primeiro: equipara policiais a bandidos, como agentes a serem igualmente temidos. Pior: reforça a incontrolável tendência do poder público brasileiro, em todos os seus
níveis, de fugir dos problemas, pedindo aos cidadãos que se eduquem
para renunciar a direitos.
Menos mal que Rosiana Queiroz,
coordenadora nacional do Movimento Nacional de Direitos Humanos, leu corretamente a iniciativa:
"A modificação de uma abordagem
policial depende de repensar a polícia, sua estrutura, a concepção militaresca, a forma de selecionar policiais, formá-los, orientá-los e dar
um bom salário a eles". Mais: "Precisa fazer uma investigação sobre
quais policiais estão envolvidos
com o crime organizado", disse Rosiana a Eduardo Scolese, da Folha.
Bingo. Pena que a tese de Rosiana seja muito difícil e trabalhosa
para implementar. E o poder público foge de tudo o que é difícil. Já
que não pode educar policiais a respeitar normas de conduta e direitos
individuais básicos, trata de educar
o público a não irritar policiais.
Como tampouco pode educar/
prender/punir bandidos, educa a
população a não reagir a eles.
Ou seja, educa-a a renunciar a
bens e ao direito de ir e vir, sob pena de perder ambos e mais a vida.
É um país muito medíocre.
crossi@uol.com.br
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