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O direito de aprender
MARIE-PIERRE POIRIER
Lançamos hoje os resultados de um estudo que buscou identificar boas práticas desenvolvidas por 37 redes municipais de ensino no país
EM 1940, apenas 21% dos brasileiros em idade escolar estavam na
escola, segundo o IBGE. Em
1960, foi atingida a marca, ainda muito baixa, de 31% de crianças e adolescentes na escola. Em 1998, alcançamos 86% e, oito anos depois, chegamos próximos da universalização do
acesso, com 98% das crianças de sete
a 14 anos na escola.
Como o país avançou nessa área!
No entanto, a cada passo, novos desafios se apresentam. Não podemos
cruzar os braços diante das 660 mil
crianças brasileiras ainda fora da escola -essa é a tradução em números
absolutos dos 2% que parecem tão
pouco. Não podemos também fechar
os olhos para os milhões de alunos e
alunas das escolas públicas submetidos à lógica perversa da repetência, da
evasão e do abandono.
A quase universalização do acesso
colocou na pauta a qualidade da educação. Não é suficiente apenas abrir
vagas e garantir matrícula para as
crianças e adolescentes. Uma vez na
escola, cada um deles tem o direito de
permanecer estudando, de se desenvolver, de aprender e de concluir toda
a educação básica na idade certa.
Nós do Unicef (Fundo das Nações
Unidas para a Infância) escolhemos o
"aprender" como tema central para
nossa atuação no Brasil em 2008. O
entendimento da aprendizagem como direito está presente na pauta das
mais importantes articulações e mobilizações em torno da educação e cada vez mais direciona as políticas públicas nos três níveis de governo.
Como contribuição para esse esforço, o Unicef, a Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de
Educação), o Ministério da Educação
e o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira) lançam hoje os resultados
de um estudo que buscou identificar
boas práticas desenvolvidas por 37 redes municipais de ensino no país.
A publicação "Redes de Aprendizagem" dirige o foco do nosso olhar para
o compromisso essencial e estratégico de todas as redes escolares deste
país: garantir o direito de aprender de
cada um dos seus meninos e meninas.
Localizadas em todas as regiões do
país, em municípios de diferentes tamanhos, as redes públicas estudadas
têm em comum tanto a inserção em
contextos de vulnerabilidade social
quanto os resultados no Ideb (Índice
de Desenvolvimento da Educação Básica) acima da média nacional. Isso
significa que, em contextos que não
facilitam a aprendizagem de alunos e
alunas, essas redes conseguiram resultados acima da média na aprendizagem de leitura e matemática, aliados a bons índices de aprovação.
Quais as diretrizes, quais as práticas, que tipo de atitudes inspiram e
mobilizam os atores educacionais
dessas redes para chegar a tais resultados? São as respostas e reflexões sobre essas questões que apresentamos
na publicação.
O estudo aponta dez aspectos considerados responsáveis pela boa
aprendizagem pelos atores educacionais entrevistados -gestores municipais, diretores e coordenadores, professores, funcionários, famílias, comunidade e, em especial, alunas e alunos. Destacam-se a valorização do
planejamento realizado de maneira
coletiva e solidária, a importância da
avaliação contínua e cuidadosa e a valorização criativa da leitura como pedra fundamental do aprender.
Nenhuma das práticas identificadas é por essência inédita ou inovadora. O que as fortalece é o fato de terem
um objetivo comum e indispensável:
a garantia do direito de aprender.
É possível ter educação de qualidade na escola pública? O estudo "Redes
de Aprendizagem" mostra que sim. E
aponta um conjunto de iniciativas
que, implementadas de maneira articulada, participativa e mobilizadora,
transformou escolas, redes e suas comunidades em espaços privilegiados
e estratégicos de aprendizagens.
São essas ações que queremos disseminar, abrindo espaços para que
novas e boas práticas sejam apresentadas. E que essa reflexão e mobilização se façam sempre com o olhar voltado para o direito de aprender daqueles que são os sujeitos de direito
desse processo: as crianças e os adolescentes no Brasil.
MARIE-PIERRE POIRIER, 47, graduada em relações internacionais pela Sorbonne e mestre em economia pela Universidade de Paris 2, é representante do Unicef (Fundo
das Nações Unidas para a Infância) no Brasil.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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