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CARLOS HEITOR CONY
Antinotícia
RIO DE JANEIRO - Todos os dias, mal acordo, abro a porta da copa e recebo
os jornais que acabaram de chegar.
Estou sonolento, ruminando os sonhos bons ou maus que tive, vontade
de nada fazer, de mandar tudo àquela necessária parte que todos conhecemos.
Os jornais trazem notícias -logo,
devem ser úteis- e, desde que me
meti no ofício -lá se vão anos-, sou
obrigado a lê-los, e, pior do que lê-los,
admirá-los.
Fico sabendo que o universo é mais
velho do que pensávamos, não tem 13
bilhões de anos, mas 16 bilhões. Velho
pra burro. Em compensação, um alemão é penta como o Brasil, mas na
Fórmula 1. Em Israel explodiu mais
uma bomba, e uma carreta numa estrada vicinal da Turquia matou 5
pessoas.
Serra acusa Ciro disso e Ciro acusa
Serra daquilo. Há um campeonato
feroz em busca de um novo Collor, e
enquanto não se chega a uma definição, Lula chora e Garotinho reza.
Nem tudo está perdido, alguém ora
por nós.
Um artigo do Luís Edgar de Andrade explica mais uma vez que quem
disse a frase "o Brasil não é um país
sério" não foi o general De Gaulle.
Testemunha ocular e auricular do famoso caso, ele submete tudo ao rigor
histórico que tanto preocupa o Ruy
Castro.
Rigor histórico: Bush está sendo
acusado de tramóias e Rivaldo não
vai renovar o contrato com seu clube
na Europa. Quê que eu tenho com tudo isso? E os outros? O quê que os outros têm a ver com a minha manhã
poluída pelas notícias que não me interessam? Alguma coisa deve estar
errada não com os outros, mas comigo.
Moisés, Buda, Cristo e Maomé nunca leram jornal, e se leram, pouco
aproveitaram. Eu aproveito de algum modo, pois vivo disso na voz ativa e passiva. Bem verdade que nunca
fundarei uma religião, mas gostaria
de, todos os dias, ao acordar, em vez
de ler os jornais, continuar dormindo
profundamente, como as crianças
dormem, como os mortos dormem.
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