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CARLOS HEITOR CONY
De nomes e desditas
RIO DE JANEIRO - Ludovico dos
Santos viveu até os 30 anos sem dar
importância ao nome. Nem ao azar.
Tudo de ruim lhe acontecia: sufocações na primeira infância, erisipela
na mocidade, mau hálito permanente, falta de dinheiro crônica,
feiúra quase absoluta e absoluta
burrice para aprender qualquer
coisa, com exceção da nobre arte de
sobreviver a tantas e tamanhas
dificuldades.
Aos 31 anos, descobriu que o nome (Ludovico) talvez fosse o culpado de tudo. E decidiu mudá-lo, avisando seus inimigos (não tinha
amigos) e credores (mas tinha dívidas) que, a partir de tal dia e tal hora, ele mudaria de nome e só atenderia aos que o chamassem de Castelar. Ninguém reclamou.
Mas por que não adotava nome
mais simples, como Jorge ou, para
ficar na letra "ele", Luiz? Uma semana após ter adotado o nome de Castelar, ele arranjou uma namorada,
que gostou exatamente de seu nome. Era uma professora primária,
passada na vida e nas amarguras.
Fora casada com um despachante
aduaneiro, abortara três vezes, parira outras tantas e, aos 36 anos, começara a sofrer de furor uterino.
Castelar apaixonou-se por ela e
vice-versa. Tiveram um filho que
justo se chamou Vice-Versa. Castelar prosperou na profissão, pois não
tinha profissão nenhuma e, com a
mulher trabalhando por ele, sobrava-lhe mais tempo para nada fazer.
Um dia, Castelar encontrou a
mulher com um cara chamado Ludovico. Usava argolas nas orelhas,
pintava o corpo com uma resina
vermelha, era cabeludo e tocava
flauta. Ela se apaixonou por Ludovico -e Castelar descobriu que o
culpado de suas desditas não era o
Ludovico, nome que portara durante tantos anos.
Decidiu mudar de nome outra
vez, mas já se habituara com o Castelar. Em dúvida, ficou com os dois,
com o Castelar e o Ludovico.
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