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CARLOS HEITOR CONY
Lições do Natal
RIO DE JANEIRO - A iconografia
cristã tem dois momentos fundamentais: a criança recém-nascida
na estalagem de Belém, tendo a
aquecê-la o hálito de um burro e de
uma vaca; e o corpo nu e maltratado
de um homem coberto de chagas e
opróbrio. Entre as duas imagens, a
história que mudaria a história para
a grande parcela da humanidade
concentrada no Ocidente.
Giovanni Papini inicia famoso livro sobre a vida de Cristo narrando
o seu nascimento: "O presépio não
é o pórtico airoso com que os pintores da Renascença, envergonhados
com a pobreza de seu Deus, criaram
para o consumo dos crentes". Bem
verdade que, antes mesmo da Renascença, a tradição apoiada nos
evangelhos coloca fatos maravilhosos em torno da gruta de Belém: os
pastores avisados pela milícia celeste, cantando a glória de Deus nas
alturas e a paz aos homens de boa
vontade.
Houve também a estrela que
guiaria os Reis Magos para a oferta
do ouro, do incenso e da mirra: "Vimos sua estrela no Oriente e viemos
com presentes adorá-lo". Os exegetas deste versículo bíblico tiram
duas lições desta simples frase: a ida
e os presentes. Não adianta ver um
sinal, é preciso ir em busca dele,
tentar conhecê-lo e interpretá-lo.
Tampouco esta ida, este movimento de um ponto a outro não deve ser feita de mãos vazias, apenas
para receber sem nada dar em troca. Os Magos foram "cum muneribus", com presentes, na velha tradição oriental.
Esquecendo o episódio cristão
em si, tudo na humanidade implica
uma viagem em busca de um sinal,
não exatamente a viagem da alucinação química (drogas) ou da religiosa (preces), mas na capacidade
de caminhar na direção da esperança. Ainda que não se encontre a salvação, o simples fato de "ir" justifica
grande parte da miséria humana.
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