São Paulo, quinta-feira, 26 de maio de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

IGOR GIELOW

O horror

BRASÍLIA - Brasília viveu ontem um daqueles dias inesquecíveis na área política -ou seja, um dia tenebroso. O grau de descompromisso moral e de hipocrisia apresentado por todos os atores no picadeiro leva a platéia a perguntar: onde é o fundo do poço?
Não se trata de falso moralismo. O show de horrores patrocinado pelo governo em sua tentativa de controlar um processo de degradação política pelo qual é o único responsável leva até o mais cínico dos observadores a ficar meio incomodado.
A genuflexão em série de José Dirceu, primeiro com Roberto Jefferson e depois com Anthony Garotinho, o ridículo discurso oficial de golpismo, medidas econômicas estranhas, fora as tradicionais liberações de emendas e promessas inaudíveis por inconfessáveis. Ontem, até Lula posando com uma cara de pau, na Coréia do Sul, parecia combinar com o escárnio generalizado.
Se ilude quem pensa que está tudo bem do outro lado. Causa angústia ver tucanos e pefelistas fingindo que nunca abafaram uma CPI e posando de arautos da responsabilidade -o "Fica Lula" de Alberto Goldman, arrematado de um fecho à Che Guevara, foi risível. Assim como é patética a agitação de antigos ocupantes do barco, enojados pelo horror que, inexplicavelmente, se descortinou.
E o que vai acontecer? Quando escala Antonio Palocci Filho para dizer que não há temores para a economia, como se na verdade eles fossem reais, o governo esconde o jogo. Muito dificilmente a economia irá piorar ou melhorar com uma CPI, ou o país irá pifar, apesar de o clima político tender à histeria.
Na mesa está 2006. É um dado ainda a ser analisado se a aparentemente infindável série de reveses políticos e as acusações de corrupção irão colar na imagem do presidente. Se sim, Lula terá apenas a economia para se sustentar. Os tucanos sabem bem o que isso significa, pois viveram tal situação no segundo mandato de FHC.
Com razões de sobra, o eleitor é levado ao niilismo: ninguém se salva. E é exatamente aí que mora o perigo.


Texto Anterior: São Paulo - Clóvis Rossi: De joelhos
Próximo Texto: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Que sociedade?
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.