São Paulo, quarta-feira, 26 de julho de 2006

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VINICIUS MOTA

O motivador

SÃO PAULO - Na falta do original, a CBF optou por Dunga, genérico de Felipão: gaúcho, macho, mandão, passional. A esperança é que o clima de micareta neurolingüística, a combinação que maximiza a "vontade de ganhar" e a "alegria de jogar", volte ao escrete amarelo.
A escolha está em harmonia com as causas básicas do fracasso do Brasil na Alemanha, segundo o diagnóstico da massa de opiniões que emergiu após a derrota para a França. Se faltou vibração, gritaria, amor à camisa e à pátria, descabelar-se à beira do campo, tratar com dureza as "estrelas", então Dunga é uma resposta lógica. Mais do que treinar os canarinhos, chegou para motivar, verbo intransitivo.
Nada disso me agrada. Prefiro o tédio parreirista, a modorra reflexiva da vida, à hiperatividade permanente -11 poodles enlouquecidos no gramado, durante 90 minutos- que Dunga prenuncia. O time de Parreira não jogou nada, não merecia ter passado da primeira fase. É de justiça, porém, reconhecer os bons exemplos que transmitiu quando a bola não estava rolando.
Queriam que Cafu se comportasse como condenado, que aceitasse as chibatadas pela desclassificação, mas ele foi altivo e disse no aeroporto que está preparado para 2010. Bravo! Queriam o mesmo de Roberto Carlos, e ele recusou a malhação. Queriam que Ronaldinho e Adriano guardassem luto pela derrota, mas eles se divertiram sem culpa a noite toda em uma boate de Barcelona. Bravo! Queriam hostilidade a Zidane, mas Robinho o abraçou no intervalo e no final da partida; queriam lágrimas "argentinas" no gramado de Frankfurt.
Parreira, a ascensão social meteórica e o trabalho na Europa fizeram bem a esses jogadores. Superaram não apenas a pobreza a que estavam fadados, não fosse o futebol. Aprenderam a comportar-se e a valorizar-se sobretudo como profissionais e assim se libertaram da catarse nacionalista. Negaram, aos olhos de milhões de espectadores, a farsa da pátria em chuteiras.


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