São Paulo, terça-feira, 26 de agosto de 2008

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Editoriais

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O desafio da cana

A LABUTA diária em um canavial é dura, se não desumana. A reportagem de Mário Magalhães e Joel Silva publicada domingo nesta Folha deixa isso bem claro. Mesmo em torno das usinas mais modernas do país, no interior paulista, o corte da cana ainda assume feições de trabalho degradante.
Sob vários aspectos, porém, as condições melhoraram, por pressão de sindicatos e Ministério Público. Houve avanços reais na formalização do emprego e no transporte de lavradores, por exemplo, nas últimas décadas.
Mesmo assim, é chocante constatar que o pagamento por tonelada de cana colhida diminuiu, em termos reais. Em 1980, pagavam-se R$ 6,53/t em média; em 2007, só R$ 3,29/t.
Apesar disso, a remuneração média diária de um cortador subiu 11,6%. A razão é simples: hoje ele corta quase dez toneladas de cana em um dia; há três décadas, eram menos de quatro.
Trata-se de um dos efeitos perversos da substituição do trabalho braçal por tecnologia, que encontra na cana um caso de manual. Embora a produção tenha mais que dobrado em oito anos, o emprego de mão-de-obra se retrai, por força da mecanização (metade da safra paulista já é colhida por máquinas). Só os mais jovens, dispostos e produtivos encontram trabalho.
A mecanização traz benefício ambiental, pois dispensa a queima realizada para facilitar a colheita manual da cana. O fogo destrói a palha e lança fuligem no ar, piorando a poluição atmosférica e a saúde da população do interior.
O governo estadual paulista firmou um protocolo com o setor sucroalcooleiro, em 2007, que antecipa de 2021 para 2014 o fim das queimadas na maior parte do Estado (áreas mecanizáveis). É o caminho correto.
Com as queimadas desaparecerão também os piores empregos. Resta por equacionar, contudo, o problema social representado pela perda projetada de mais de cem mil vagas só em São Paulo. A saída é requalificar e recolocar essa legião de lavradores.
Governo federal e entidades sucroalcooleiras lançaram um Plano Setorial de Qualificação, mas com a meta tímida demais de beneficiar 2.700 trabalhadores. Basta dizer que esse é o mesmo contingente desempregado a cada ponto percentual de avanço na mecanização da colheita.


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