São Paulo, terça-feira, 26 de setembro de 2006

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A AGU na pauta contra a corrupção

JOSÉ WANDERLEY KOZIMA

A AGU é, sem dúvida, a instituição constitucional que mais pode contribuir para a sensível redução dos níveis de corrupção no país

HÁ DIAS das eleições, acirram-se os discursos, e os estrategistas ajustam os ponteiros das campanhas. Nesse contexto, no último dia 14, o candidato a presidente pela coligação PSDB/PFL lançou, em Juiz de Fora, um "pacote anticorrupção", no bojo do qual se destaca a louvável proposta de dotar a AGU (Advocacia-Geral da União) de um setor encarregado de recuperar o dinheiro desviado com corrupção.
No início do ano, o líder do PFL na Câmara, em meio à surpreendente amplitude do escândalo do mensalão, anunciara a pretensão do partido de ampliar os poderes da AGU como resposta eficaz à corrupção.
No âmbito do governo atual, embora não se saiba de proposta específica de fortalecimento da AGU -nem, ao menos, no sentido de dotá-la de melhor estrutura-, foi afirmado que a advocacia pública federal seria prioridade, âmbito no qual se inclui destacadamente a AGU, integrada pela Procuradoria-Geral da União, Consultoria-Geral da União e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, e tendo por órgão vinculado a Procuradoria-Geral Federal, responsável pela representação judicial e extrajudicial das autarquias e fundações federais.
Talvez não saiba o candidato da oposição, mas o setor já existe, embora lhe falte realmente estruturação adequada para que alcance o máximo de eficiência, o que se condiciona, em parte, à legislação processual do país.
No governo anterior, infelizmente, o que houve, contudo, foi o agigantamento ineficiente da estrutura da AGU, escancarando-se as portas para o ingresso de servidores não aprovados em concurso público. Hoje, entre os advogados da União, mais de 18% da força de trabalho da área-fim são integrantes de uma ficção chamada quadro suplementar, servidores não concursados, mas com igual remuneração e iguais direitos dos membros da AGU e sem possibilidade de exercer idênticas funções, a maioria cedidos para governos estaduais e municipais de ex-territórios.
Esse desrespeito ao dinheiro público e à Constituição fora denunciado pelo então deputado José Serra, por políticos da outrora oposição e também por esta Folha, que produziu editorial condenando a prática e revelando suas nefastas conseqüências.
O atual governo ainda não deu cobro desse desperdício de dinheiro público engendrado no governo anterior.
No governo Lula, a priorização da atividade judicial de defesa do patrimônio e rendas públicas federais, do controle interno da juridicidade dos atos da administração e da representação judicial do país no plano internacional, infelizmente, não avançou além das promessas, a última solenemente descumprida com o abandono do projeto de remuneração por subsídio dos advogados públicos federais em patamares condizentes com as demais carreiras das chamadas "funções essenciais à Justiça".
Aliás, esse é um aspecto de uma situação mais grave: à parte a imensa evasão de quadros qualificados, constata-se o desempenho das atividades privativas da AGU por pessoas que não são seus membros e que ocupam cargos estratégicos, aos quais tiveram acesso não pela via estreita do concurso público, mas por terem sido para eles nomeados em cargos e funções comissionados. Atualmente, há registros de consultorias jurídicas de ministérios com cargos envolvendo funções eminentemente técnicas ocupados por não concursados que usurpam competências dos membros da AGU, com ofensa direta à Constituição, fomentando um cenário favorável à corrupção e a todo tipo de prática patrimonialista.
A situação, detectada há algum tempo, está sendo levada ao Ministério Público Federal e ao Tribunal de Contas da União e exigiria especial atenção do governo atual e do futuro, qualquer que venha a ser, e principalmente do Parlamento, pois não se coaduna com propostas de fortalecimento da AGU e de priorização das fundamentais e estratégicas atividades desenvolvidas.
Dessa forma, é bom ver a AGU em pauta novamente, pois é, sem dúvida, a instituição constitucional que, preventiva e repressivamente, mais pode contribuir para a sensível redução dos níveis de corrupção no país, pois não apenas exerce a representação judicial e extrajudicial da União mas também realiza o controle da juridicidade dos atos da administração. Não se conhece, contudo, uma instituição que venha enfrentando tantos obstáculos ao desempenho eficaz e pleno de suas funções constitucionais a bem do Estado e da sociedade.


JOSÉ WANDERLEY KOZIMA, 40, mestre em direito pela Universidade Federal de Santa Catarina, é o presidente da Anauni (Associação Nacional dos Advogados da União).

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