São Paulo, sábado, 26 de outubro de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

Grande rumor

RIO DE JANEIRO - Às vésperas de uma final da Copa do Mundo, pode haver um favorito, mas só se tem certeza da vitória quando Sua Excelência, o Árbitro, "trila o apito final" -a expressão "trila o apito final" pertence aos locutores esportivos e embirro com ela, apito deve apitar, e nunca trilar.
Rastreada pelas pesquisas, que nas últimas semanas se tornaram diárias, a eleição presidencial perdeu o fator surpresa. Amanhã, por exemplo, Lula deverá eleger-se presidente do Brasil -e não importa se com tantos votos para mais ou para menos. O próprio Lula não é surpresa, é a quarta vez que tenta a Presidência. E água mole em pedra dura tanto bate até que fura.
Votei nele uma vez, no segundo turno. Sem entusiasmo, mas votei. Neste ano, não votei em ninguém para presidente por opção pessoal. Mas não é disso que pretendo falar.
Lembro o trecho das memórias de JK sobre a eleição em que ele derrotou o general Juarez Távora, na campanha presidencial de 1955. Não havia pesquisa na época, pelo menos em nível técnico confiável. Os dois candidatos estavam certos de que venceriam, sendo que JK, mais otimista, achava que ganharia facilmente, logo nos primeiros dias (a apuração demorava uma semana ou mais).
No dia seguinte ao pleito, Juarez pegou vantagem e abriu distância. No segundo dia, a coisa piorou, piorou tanto que JK desanimou de acompanhar a apuração. Abandonou o rádio e foi cumprir um dever social, para relaxar.
Em Belo Horizonte, o silêncio era pesado, ninguém esperava pela derrota dele. No meio do compromisso, de repente, JK ouviu um rumor vindo da rua. Pensou que fosse um acidente ou coisa parecida. Mas o rumor cresceu e se aproximou. Era o povo que ouvira os últimos resultados da apuração e buscava o vencedor. Começava a vantagem progressiva do novo presidente do Brasil. O resto pertence à história.
Não sei por que estou lembrando isso.


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