São Paulo, quinta-feira, 27 de junho de 2002

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O FUTEBOL

Decididamente, o futebol desperta alguma coisa na maioria das pessoas. No caso específico do Brasil, ele vem despertando os próprios brasileiros, no meio da madrugada ou início da manhã, para assistir às partidas da seleção comandada por Luiz Felipe Scolari. O esforço pelo menos tem valido a pena. Estamos na final.
Um autor que abordou de forma bastante interessante a relação do ser humano com o jogo (a brincadeira) foi o historiador holandês Johan Huizinga (1872-1945). Em seu "Homo Ludens", de 1938, ele sugere que a cultura e a própria civilização podem ser vistas como o resultado de um jogo. As mais diversas atividades humanas, aí incluídas linguagem, filosofia, guerras, leis, teriam surgido, segundo Huizinga, como consequência de uma brincadeira.
A escrita, por exemplo, seria o produto de uma mistura lúdica de sons, símbolos e significados. O caso do direito é exemplar. Em alguns tribunais brasileiros, juízes e advogados utilizam até hoje a toga, numa alusão ao caráter cênico do mundo das leis.
Para Huizinga, o jogo encerra várias dimensões. Há o lado da competição, o da ilusão e da exuberância, o do divertimento, de matar o tempo. Ocorre, pela interação desses elementos, uma espécie de deslocamento da realidade. Quando brincamos, temos a consciência de que estamos operando sob regras diferentes das que regem o mundo real.
Durante os 90 minutos que dura uma partida de futebol, nos refugiamos num mundo especial, que sabemos como funciona e do qual conhecemos todas as leis. Há, numa partida de futebol -como todos pudemos comprovar ontem- ,espaço para que experimentemos sensações como a de tensão ou a de júbilo.
A tese de Huizinga de que a capacidade de brincar está na aurora da civilização é arrojada, mas belamente defendida pelo autor. Mesmo que não a aceitemos como uma verdade absoluta, parece razoável sustentar que o futebol nos envia, por prazo limitado, para uma outra dimensão, descolada da realidade. Do jeito que está a realidade, é um refresco.


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