São Paulo, sábado, 27 de novembro de 2004

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LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

Violência e reformas sociais

Na última semana, o Brasil presenciou dois grandes atentados contra a vida que exigem ação pronta do governo e da sociedade para apurar os fatos e responsabilizar e punir os agressores.
O primeiro ato de violência atingiu a população indígena do povo macuxi na área demarcada da terra Raposa/ Serra do Sol, em Roraima. Durante a longa espera pela homologação das terras, tem havido, como é do domínio público, a invasão progressiva de fazendeiros, plantadores de arroz.
Na terça-feira, 23/11, foi baleado o indígena Jocivaldo Constantino por pistoleiros na aldeia Jawari. Na mesma ocasião, constataram o desaparecimento do indígena Nelson da Silva. A ação violenta estendeu-se às aldeias Brilho do Sol e Retiro São José, causando a destruição de casas por tratores e pelo fogo. Foram também arrasadas as plantações. Esse ataque covarde contra as populações indígenas coincidiu com a visita a Roraima do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, que tem agido com discernimento no sentido de respeitar a Constituição quanto aos direitos indígenas.
A segunda agressão à vida aconteceu no Estado de Minas Gerais, no município de Felisburgo. Houve terrível chacina no acampamento Terra Prometida, ocupado por 200 famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra há mais de dois anos. Trata-se de terra devoluta, que, portanto, pertence ao patrimônio do Estado, não podendo ser reivindicada por pretensos proprietários.
No dia 20/11, ao meio-dia, as famílias foram surpreendidas por um grupo de 15 pistoleiros que se dirigiram ao barraco onde estava reunida a coordenação do acampamento. Forte rajada de balas atingiu os ocupantes. Quatro trabalhadores foram assassinados, outro faleceu antes de chegar ao hospital. Há 20 feridos, alguns em estado grave. Todas as barracas foram incendiadas, deixando as famílias no desamparo, sem comida e sem seus objetos.
Os fatos são evidentemente lamentáveis e exigem atuação imediata do governo federal e estadual, não só para fazer justiça mas para garantir a decisão de levar adiante as medidas indispensáveis à repartição equitativa da terra, em especial agilizando o processo de restituição das terras devolutas para efeito de reforma agrária.
Para efetivar o direito das populações indígenas, a justa distribuição da terra e o acesso ao trabalho, não basta a opção governamental, que esperamos se realize. Torna-se necessária a cooperação de todos. Isso exige mudança de mentalidade, tantas vezes relembrada pela Igreja, à luz da fraternidade, própria dos filhos de Deus e que deve presidir a construção da sociedade justa e solidária.
A pobreza e a miséria que assolam milhões de brasileiros revelam o quanto estamos distantes deste ideal. As reformas sociais básicas são urgentes para que todos tenham condições dignas de vida e para evitar que as injustiças e desigualdades econômicas e sociais provoquem mais violências.
Diante dos graves fatos acontecidos e de outros semelhantes, procuremos voltar o coração para Deus e rever nosso comportamento pessoal. Não podemos nos omitir quando está em questão a vida de tantos irmãos, a justiça e a paz social. É sempre tempo de conversão e de esperança.


Dom Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.


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